O Mercúrio - Boletim eletrônico da Academia Brasileira de Pediatria

Parto humanizado: qual a razão do adjetivo?

Ac.Jefferson P Piva
Acadêmico titular da cadeira n.30
Secretário da Academia Brasileira de Pediatria

Nas últimas duas décadas o Brasil vem observando um acirramento e polarização nas discussões de temas desafiadores de nossa sociedade. Infelizmente, a discussão com base racional e científica foi sendo substituída pela paixão ideológica, pela dialética superficial e focada em verdades parciais. Na saúde sobram exemplos de discussões estéreis de conteúdo, porém,

EDITORIAL

ricas em proselitismo e calcadas em dados duvidosos. Cria-se então um ambiente propício para soluções pretensamente inovadoras que rapidamente se traduzem em resultados pífios e consequências trágicas, tais como os verificados na reforma manicomial, no programa dos mais médicos, na proliferação de escolas médicas, na implantação das UPAS como solução para desafogar as emergências hospitalares, entre tantas outras iniciativas definidas na base da emoção, da ideologia e dissociadas da real necessidade.

No encaminhamento destes desafios da saúde se identificam algumas estratégias comuns, tais como: a) apresentar o problema a partir de uma perspectiva parcial e com forte apelo emocional; b) demonizar parta da solução atual para desqualificar qualquer resistência ao novo modelo proposto; c) propor soluções desconexas de nossa realidade, desconsiderando o contexto, a complexidade e outros pré-requisitos para sua implantação. Neste cenário confuso e abstrato, perdem-se os parâmetros de comparação e argumentação, com desconstrução da racionalidade dando lugar à argumentação intuitiva, falaciosa e estéril.

Lamentavelmente, o atendimento a gestantes tem seguido este caminho pontuado por discussões ideológicas nos meios midiáticos. A análise da complexidade da assistência à gestante no Brasil tem sido reduzida a uma mensagem subliminar sob o lema do “parto humanizado”. Nesta adjetivação estariam abrigados todos os problemas a serem enfrentados: a analgesia à gestante durante o parto, o excesso de cesarianas, a ainda elevada mortalidade perinatal, a falta de consultas pré-natais, o alto índice de partos em adolescentes, entre outras. Como objeto antagônico a este novo paradigma (o “parto humanizado”) foi escolhido o obstetra que passa a ser demonizado como o único responsável por todos estes problemas. Criado o ambiente de confusão e falta de referenciais, surgem os novos protagonistas e benfeitores para a realização do tão almejado “parto humanizado”: as enfermeiras, as dolas, e outros profissionais que se assim o desejarem. Pois, a exemplo da reforma manicomial, criou-se um novo patamar de discussão, com a negação de tudo o que até agora vinha sendo realizado.

Um dos argumentos mais utilizados na defesa de partos por não médicos é que a gestante teria total autonomia para decidir sobre seu corpo, sendo seu direito exclusivo, de decidir quem fará o seu parto. Todos reconhecemos o respeito a autonomia de pacientes adultos e plenamente capazes, assegurado em vários artigos do Código de Ética Médica. Entretanto, esta decisão tem como limite que não imponha risco ou prejuízo a terceiros, como no caso do recém-nascido. Nesta decisão, DEVEM SER PRIORIZADOS os melhores interesses do recém-nascido que, obviamente, pressupõe um parto com acesso aos melhores recursos humanos e materiais disponíveis. Este também é o entendimento do judiciário, manifesto pela decisão da Justiça do Rio grande do Sul em 2014, que decidiu que uma gestante realizasse cesariana de emergência, contra a sua vontade, por considerar que a gravidez, que estava na 42ª semana, era de risco e ameaçava a vida do bebê. (1)

O Código de ética médica em consonância com o código civil também privilegia e protege os interesses do recém-nascido por ocasião do parto, em especial em seus artigos 32 (assegurar que os melhores recursos sejam disponíveis) e artigo 1 (veda ao médico causar dano quer seja por ação ou omissão caracterizável como imprudência, imperícia ou negligência). Nas instituições hospitalares é responsabilidade do Diretor Técnico dar as condições necessárias para a assistência médica em obediência aos preceitos éticos. Exatamente, nesta perspectiva que o Conselho de Medicina do RS editou a Resolução CREMERS 002 de 2015 (2), visando garantir ao Recém-nascido um padrão mínimo de qualidade e a devida atribuição de responsabilidades, onde destacamos os seguintes artigos:

Artigo 1º - É atribuição do Diretor Técnico assegurar à gestante e ao recém-nascido atendimento com uma equipe médica completa e permanente de obstetras, pediatras e/ou neonatologistas e anestesistas, bem como os equipamentos necessários ao acompanhamento obstétrico.

Artigo 2º - É atribuição do Diretor Técnico do estabelecimento de saúde tomar as providências cabíveis para que a gestante e o recém-nascido, durante o período de internação, tenham médico assistente responsável, desde a internação até a alta;

Artigo 3º - Nos hospitais nos quais o parto e o atendimento do recém-nascido são realizados por profissionais não médicos autorizados pela Administração e Direção Técnica do Hospital, o Diretor Técnico assume a responsabilidade médica pelo atendimento e internação hospitalar;

Parágrafo Primeiro – Os médicos do Corpo Clínico não são obrigados a realizar internação hospitalar em seu nome e não podem delegar ou assumir a responsabilidade por atos ou atribuições da profissão médica praticados por outros profissionais, conforme preceituam os artigos 2º e 5º do Código de Ética Médica (Res. CFM nº 1931/09); Outro grave problema a ser enfrentado era o exagerado número de cesarianas realizadas em nosso país. Trata-se de um problema complexo e multifatorial, havendo participação da classe médica, de decisão da própria parturiente (autonomia) e da infraestrutura assistencial. Há algum tempo o tema vinha sendo pautada pelo embate emocional e uso parcial de dados. Levando em consideração as evidências científicas e os melhores interesses dos envolvidos, o Conselho Federal de Medicina editou a resolução CFM 2.144/2016 que estabelece que "A partir de 39 semanas de gestação é ético o médico atender à vontade da gestante de realizar parto cesariano, garantida a autonomia do médico, da paciente e a segurança do binômio materno fetal." Este é apenas mais um exemplo, onde a discussão de um problema a partir de argumentos científicos e da razoabilidade é possível obter uma solução abrangente e que contemple os diversos interesses.

A história da humanidade já demonstrou de forma inquestionável que utilização de sofismas, de meias verdades e pressupostos ideológicos, além de retardar a solução do problema nos conduzem a caminhos perigosos. Não há dúvidas que a participação de outras profissões na assistência médica contribui de forma decisiva em melhores resultados e representa um avanço no atendimento prestado à população. Entretanto, é claro e inquestionável que, visando a segurança e melhores interesses dos pacientes, a assistência médica DEVE estar sob a LIDERANÇA e RESPONSABILIDADE do médico, o qual responde de forma intransferível por seus atos.

1- https://oglobo.globo.com/brasil/justica-obriga-mulher-fazer-cesariana-contra-vontade-no-rs-12066737 (acessado em 12 de julho de 2018)

2- http://www.cremers.org.br/index.php?indice=24&&noticiaTremo=1872 (acessado em 12 de julho de 2018)

3- https://portal.cfm.org.br/images/stories/pdf/res21442016.pdf (acessado em 12 de julho de 2018)

Fóruns da ABP

O Fóruns da ABP, idealizados pelo Acadêmico Julio Dickstein  amplamente apoiado pelos demais acadêmicos, vêm cumprindo com seus objetivos. Dirigidos às equipes de Saúde, têm sido abordados os mais diferentes temas relacionados a políticas públicas relativas às crianças  e aos adolescentes, com a finalidade de promover sua saúde e seu bem estar.

Até este momento, a ABP realizou 20 Fóruns  em diferentes estados do país. assim distribuídos: Rio de Janeiro - 3 (1 em Petrópolis); São Paulo - 3 (2 em Campinas); Mato Grosso - 2; Espírito Santo - 2; Baía - 2; Sergipe - 2; Rio Grande do Sul - 1; Brasília - 1;  Goiânia - 1; Minas Gerais - 1; Alagoas - 1; Paraná - 1; Pernambuco - 1.

O número de atividades por Fórum esteve concentrado entre uma e cinco atividades (14 fóruns - 70%); e em seis fóruns (30%) houve 8 atividades.

Os vários temas abordados, todos de grande relevância, foram abrangendo uma enorme gama de situações que atuam no desenvolvimento de crianças e adolescente, desde a história da criança e do adolescente, do Brasil colônia ao Brasil da atualidade; o papel do Estado, da família, da mídia e do meio ambiente; o efeito das drogas (particularmente tabaco e álcool), a violência (incluindo ciber violência), enfim procurando sempre analisar aspectos que tragam alguma proposta ou até mesmo solução para esse verdadeiro “mar” de problemas.

Assim é que estamos chegando ao 21º primeiro Fórum que deverá se realizar em Belo Horizonte, em 2019,  em data ainda a ser divulgada e temos a certeza de que será mais uma atividade vitoriosa da ABP/SBP.

Notícias breves

A Comissão de Ética é a mais nova Comissão da ABP, composta pelos Acadêmicos Jefferson Pedro Piva; Navantino Alves Filho; Ney Fonseca; Nelson Grisard; e ainda contando com a participação do próprio Presidente da ABP, Mario Santoro Jr. A partir da próxima Assembleia da Academia a se realizar em São Paulo, em data a ser determinada, essa Comissão passará a exercer suas atividades.

O Presidente da ABP, acadêmico Mario Santoro Jr., foi eleito membro da Academia de Letras, Ciências e Artes a Associação dos Funcionários Públicos do estado de São Paulo.

A acadêmica Conceição A. M. Segre lançou em abril próximo passado, em colaboração, o livro “Efeitos do Álcool na Gestante no Feto e no Recém- nascido” na sede da SPSP, com a presença da Presidente da SBP, acadêmica Luciana Rodrigues da Silva.

À acadêmica Sheila Knupp de Oliveira os sinceros cumprimentos pela merecida e brilhante homenagem que lhe foi prestada pela Faculdade de Medicina da UFRJ. Trata-se de merecido reconhecimento pela dedicação emprestada pela Acadêmica Sheila Knupp de Oliveira, à Medicina, à Pediatria e, particularmente, à Reumatologia Pediátrica.

O novo Regulamento da ABP entrará em discussão com a Diretoria da SBP no próximo mês de julho.

O novo site da ABP já está on-line. Consulte-o, assim você vai ficar a par das atividades da Academia.

Ac. Lícia Maria Oliveira Moreira
Titular da cadeira n.4

Sífilis Congênita: um grande desafio à Saúde.

A Sífilis é uma das enfermidades mais antigas descritas na literatura médica, sua fisiopatologia é bem conhecida, tem diagnóstico e tratamento de baixo custo mas é uma doença re-emergente na Europa, Estados Unidos, China e  Austrália e vem desafiando a América latina e África por décadas.

Os primeiros registros sobre essa doença ocorreram no fim do século XV com o relato de Antonio Beneviene, quando surgiu uma epidemia na Europa que foi atribuída ao regresso de Cristóvão Colombo da América. Recentemente foi detectado Treponema pallidum em genomas de esqueletos datados entre o século XVII e XIX, que foram encontrados na Capela Santa Helena na cidade do México.

No fim do século XIX o famoso pintor norueguês Edvard Munch retratou uma mãe com seu filho com sífilis no quadro The Inheritance, causando fortes críticas da sociedade europeia ao pintar alguém com doença sexualmente transmitida (DST). A Sífilis era uma enfermidade então muito discriminada pela conotação sexual, dificultando sua abordagem.

Sífilis congênita (SC) foi conhecida por muitas décadas como doença de caráter hereditário e só no início do século XX, foi reconhecida como patologia infecciosa com transmissão perinatal.                                                                  

O agente etiológico o Treponema pallidum, foi identificado em 1905 por Schadinn e Hoffmann, é composto de proteína, polissacarídeo e lipídios, multiplica-se por divisão binária e é facilmente destruído. O homem é o seu reservatório natural. Trata-se de uma infecção perinatal crônica com grandes repercussões médico sociais em decorrência da sua morbimortalidade. Prematuridade, baico peso, morte perinatal, anomalias congênitas, doenças ativa no recém nascido, óbito perinatal e sequelas a longo prazo estão associadas à sífilis.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima a ocorrência de mais de um milhão de casos de Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST) por dia no mundo. Ao ano, calculam-se aproximadamente 357 milhões de novas infecções, entre clamídia, gonorreia, sífilis e tricomoníase. A sífilis afeta um milhão de gestantes por ano em todo o mundo, levando a mais de 300 mil mortes fetais e neonatais e colocando em risco de morte prematura  mais de 200 mil crianças. Na América Latina e Caribe, estima-se que entre 166.000 e 344.000 crianças nasçam com sífilis congênita anualmente. Alguns países já conseguiram erradicar ou mesmo reduzir significativamente a transmissão vertical da sífilis e HIV. O Reino Unido passou de uma situação de maior causa de morbimortalidade para uma condição raramente encontrada. Cuba em 2013 teve sua transmissão vertical erradicada.

Sifilis nos Estados Unidos: nos últimos 70 anos tem apresentado redução seguida de rápidos aumentos. Entre 2012 e 2014 o número de casos de SC aumentou nos Estados Unidos de 334 para 458  com uma frequência de 8.4 para 11.6 casos por 100.000 nativivos. A taxa em mulheres aumentou 22,2% com 0.9 a 1,1 casos por 100.000 mulheres. Ocorreu elevação em todas as regiões mas o maior aumento foi na região Oeste. Alguns grandes estados como Texas e Ohio tiveram redução de seus casos, traduzindo a necessidade de abordagens mais específicas, levando em consideração aspectos sociais, culturais, econômicos e políticas de saúde.

No Brasil, nos últimos cinco anos, foi observado um aumento constante no número de casos de sífilis em gestantes, sífilis congênita e adquirida, que pode ser atribuído, em parte, pelo aumento da cobertura de testagem, com a ampliação do uso de testes rápidos, falha nas ações preventivas de educação em saúde, com baixa adesão ao tratamento, redução do uso de preservativo,resistência dos profissionais de saúde à administração da penicilina na Atenção Básica, desabastecimento mundial de penicilina, entre outros.

O aprimoramento do sistema de vigilância pode se refletir no aumento de casos notificados. Em virtude da abordagem conjunta adotada pela OPAS para a eliminação da transmissão vertical do HIV e da sífilis, e a partir dos indicadores de impacto estabelecidos para a América Latina e Caribe, o Brasil optou por utilizar a taxa de incidência de SC de ≤ 0,5 caso/1.000 nascidos vivos, nos últimos três anos, para a habilitação de seus municípios ao processo de certificação nacional. No período de 2005 a junho de 2017, notificou- se no SINAN um total de 200.253 casos de sífilis em gestantes, dos quais 44,2% foram casos residentes na Região Sudeste, 20,7% no Nordeste, 14,6% no Sul, 11,1% no Norte e 9,4% no Centro-Oeste.    

No período de 2010 a 2016 observou-se uma  elevação da taxa de incidência de SC e das taxas de detecção de sífilis em gestante por mil nascidos vivos que aumentaram cerca de três vezes nesse período, passando de 2,4 para 6,8 e de 3,5 para 12,4 casos por mil nascidos vivos, respectivamente. A sífilis adquirida, que teve sua notificação compulsória implantada em 2010, teve sua taxa de detecção aumentada de 2,0 casos por 100 mil habitantes em 2010 para 42,5 casos por 100 mil habitantes em 2016.

Conforme dados do Ministério da Saúde em 2016, foram notificados no Brasil 87.593 casos de sífilis adquirida, 37.436 casos de sífilis em gestantes e 20.474 casos de SC com 185 óbitos. A maior proporção dos casos foi notificada na região Sudeste. As taxas mais elevadas de sífilis em gestantes foram encontradas no Espírito Santo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Mato Grosso do  Sul. Em relação à SC, os três primeiros estados supracitados permanecem em evidência, ao lado do estado de Pernambuco. Quando observados os óbitos por SC em menores de 1 ano de idade, sobressai a taxa de 18,1 óbitos/ 1.000 nascidos vivos no estado do Rio de Janeiro, representando 23,2% do total observado em todo o país. A mortalidade por sífilis no Brasil aumentou 150% comparando 2004 e 2013 (2,2-5.5 por 100.000 nativivos).

Perfil das gestantes acometidas descrito no Boletim Epidemiológico de 2017: maioria pardas, idade entre 19 e 29 anos, tinham baixa escolaridade, 81% fizeram pré natal, 57% tiveram diagnóstico no pré natal, 88%  usaram pelo menos uma dose de penicilina benzatina, apenas 15,2% dos parceiros foram tratados .

A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que 5.6 milhões de doses de 2.4 milhões de penicilina benzatina são necessárias anualmente para tratar todos os casos de sífilis e 930.000 doses são necessárias para prevenir todos

os casos de SC. Em maio de 2016 na 69.a Assembleia Mundial de Saúde foi relatada a redução da  penicilina benzatina nos últimos anos. Estudos têm demonstrado segurança no uso de amoxilina e cefatriaxone como alternativa à penicilina no tratamento das gestantes. A OMS estima um custo médico associado aos efeitos adversos ao feto, em torno de U$309 milhões de dólares ao ano, certamente valor muito menor que o necessário para medidas preventivas desse agravo. Inúmeras tentativas sem sem sucesso têm sido feitas no sentido de erradicar a Sífilis. Cerca de 239 artigos relevantes sobre prevenção da SC foram publicados entre julho e novembro de 2017, há uma enorme mobilização da comunidade científica para erradicar a Sífilis, afecção aparentemente de fácil controle, porém necessita de políticas governamentais efetivas com envolvimento da população.

Temos um País continental com difícil abrangência, mas vontade política, acesso garantido a serviços de saúde eficazes, educação de modo que os pacientes e seus parceiros sejam advogados de sua própria saúde, compreendam o que podem fazer para minimizar seus riscos, poderão mudar esta história como aconteceu em alguns programas exitosos no país.

Ima. Acadêmica Dra. Conceição M. Segre

Editora do Boletim - O Mercúrio

Academia Brasileira de Pediatria (ABP)

Hoje ao acessar o novo site da ABP, tive a oportunidade de conhecer e de ler o Boletim eletrônico O Mercúrio. Como leitor das publicações pediátricas, parabenizo pela criação desse Boletim muito bem estruturado, moderno, com sessões que permitem uma visão, com a grande competência e experiência dos acadêmicos, da história e das atividades dessa importante Instituição, de questões referentes à pediatria, à cultura e à realidade brasileira. Com certeza, representará mais uma importante contribuição para o pediatra.   

Atenciosamente,
José Hugo de Lins Pessoa
Ex-Presidente da Sociedade de Pediatria de São Paulo


Prezado Dr. Mario Santoro Junior

Acessei o site e visualizei o item Mercúrio. Nos tempos atuais em que prevalece  a tecnologia, considero de suma importância esse Boletim Mercúrio que facilita a divulgação de eventos, atualização de noticias e principalmente por ser um meio em que os acadêmicos possam interagir e manifestar suas opiniões.

Como presidente da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores SOBRAMES Regional São Paulo, fiquei muito contente ao saber que esse espaço também permitirá aos médicos se expressarem com poesias, contos e crônicas. É uma abertura para a literatura não científica que já tem comprovado seus benefícios (tanto pessoais como na qualidade do relacionamento médico-paciente).

Por fim, agradeço a ABP por possibilitar a participação da SOBRAMES SP na elaboração do seu Hino.

Desejo sucesso e harmonia em todos os projetos da ABP, reafirmando a disposição sobramista em colaborar em seu pleno êxito.

Atenciosamente,

Márcia Etelli Coelho
Presidente da SOBRAMES SP


Resenha Cultural - Ac. Mario Santoro Jr - Presidente da ABP

Livro: A  Praga
Autora: Manuela Castro
Editora Geração Editorial
Ano: 2017

Manuela  Castro, jornalista, na época em que inicia esse livro  trabalhava na redação da TV Brasil e era responsável jornalisticamente por acompanhar o que acontecia no Palácio do Planalto. Numa das pautas constava na agenda da Presidência uma reunião com representantes do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas por Hanseníase- Morhan. Não seria um item para despertar a atenção dos jornalistas frente a tantos outros constantes da agenda presidencial:  reunião com reitores, ministros, secretários, etc . No entanto ela ficou curiosa para saber por qual motivo os representantes daquele movimento estavam ali. Desta curiosidade inicial nasceu um longo trabalho. As descobertas foram divulgadas no programa “Caminhos da Reportagem “ no episódio denominado: “Hanseníase, a história que o Brasil não conhece” ,agraciado com o prêmio Jornalista Tropical e com a menção Honrosa do Sindicato dos Hospitais, Clínicas e Casa de Saúde do Município do Rio de Janeiro. Em seguida também foi agraciado com os prêmios Sebrae de Jornalismo, Ministério do Meio Ambiente e CNBB de Comunicação.

Manuela Castro nos mostra que o medo sempre esteve envolvendo esta doença, a começar pelo nome: Lepra. Tanto assim que numa tentativa de diminuir o preconceito foi promulgada a Lei n º 9010 de 29 de Março  de 1995 mudando o nome Lepra para Hanseníase e tornando proibido o uso do termo Lepra e seus derivados na linguagem empregada nos documentos oficiais da União e dos Estados-membros.

A autora nos mostra que durante milênios o leproso foi isolado da sociedade, abandonado em cavernas ou em locais bem longe da Sociedade. Olhar para um leproso era sinal de mau agouro. Manuela Castro discute a origem da doença e sua disseminação pela Europa. No Brasil o aparecimento da lepra deu origem a preconceitos iguais e a políticas de segregação dos pacientes que culmina com a criação de leprosários, verdadeiras prisões, com afastamento de suas famílias de forma compulsória. À dor da doença deformante somava- se o afastamento por anos de seus entes queridos. A autora visitou várias destas colônias sendo que algumas ainda existem nos dias de hoje e que abrigam ex-internos que, apesar de terem tido altas, não tiveram para onde ir e por lá permaneceram. Este livro é um relato do sofrimento intenso de pacientes ,arrancados do convívio em suas comunidades e colocados em colônias, muitas das quais jamais foram abrigos colhedores. Em 1940, com a introdução das Sulfonas na terapêutica da Hanseníase , mas  de forma errônea, mesmo quando já havia medicamentos efetivos para tratar esta doença, o isolamento compulsório foi mantido até 1986.

 No entanto estes pacientes mesmo curados continuaram a sofrer as consequências do preconceito e ficaram presos a um sem número de dificuldades. Muitos até hoje buscam por seus familiares perdidos ao longo de muitos anos de isolamento. Outros tantos, quer pelo preconceito quer por suas mutilações, não conseguem empregos. Manuela Castro descobre que muitos leprosários eram verdadeiras cidades autônomas, isoladas do mundo e celeiro de histórias tristes de dor e sofrimento.

Após as apresentações televisivas a autora idealizou este livro que como se lê numa das suas orelhas ”com fartas ilustrações e depoimentos comoventes, ora alarmantes, traz

Toda a realidade das famílias desintegradas, das práticas desumanas, e do preconceito que insiste em condenar ex-internos ao isolamento social que já sofriam na Idade Média e nos tempos bíblicos.

Considero a leitura deste livro, pelos profissionais de saúde, quase obrigatória. Quiçá com estes conhecimentos possamos ajudar aos que lutam por maior atenção  as assim chamadas doenças negligenciadas, entre as quais a Lepra se inclui, ao lado de outras como Doença de Chagas, Esquistossomose, Tacoma, etc. É importante saber que a Hanseniase   tem 30 mil casos novos/ano com uma incidência de 14 casos por 100 mil habitantes. Não só ler como divulgá-lo entre os internos e residentes!

Dando continuidade à sessão  “Histórico da Academia”, além de fatos vivenciados pelos Acadêmicos, vamos também publicar as biografias dos patronos. Começamos com alguém, cujo nome estará para sempre e indelevelmente ligado ao desenvolvimento da Neonatologia brasileira, Nicola Albano, patrono da cadeira n. 29.

Nicola Albano nasceu em 20 de outubro de 1935, na cidade do Rio de Janeiro, filho de pai imigrante italiano e mãe filha de italianos, educada na Itália.

Tornou-se um intelectual, sob a influência da mãe: tinha gosto pela música, pela pintura, pela leitura, tocava piano, apreciava o canto e a dança. Falava várias línguas e adorava comprar livros que falassem de tudo, sobre tudo. Chegou mesmo a fazer um curso de crítico de cinema. Nunca foi um mero espectador: foi sempre o centro de qualquer reunião, fosse elas familiares, científicas ou não. Era o elo de união da família, conselheiro e amigo, filho carinhoso, cuidou da mãe com desvelo até o fim de sua vida.

Possuía um forte lado religioso, sendo devoto de Santa Clara e de São Francisco, frequentava a missa aos domingos e lia a Bíblia. Tinha, contudo, múltiplas facetas: exercitava o bom gosto com classe. Adorava antiguidades, que comprava sem olhar o preço. Era completamente incapaz de lidar com dinheiro. Generoso, desprendido, modesto, manifestou um sonho: o de ter um sítio, com uma família, filhos e muitos animais. Chegou apenas a ter o sítio, como parte desse sonho. Aliás, lá havia uma produção de legumes e verduras que doava toda, semanalmente, aos pobres da Igreja. Entre as crianças, confundia-se com elas e seu trabalho sempre foi a elas dedicado. Amigo leal estava sempre pronto a ajudar quem dele se aproximasse.

Em 1961, graduou-se em Medicina pela Faculdade de Ciências Médicas do Rio de Janeiro. Em seguida, tornou-se estagiário no Hospital do Servidor Público do Estado do Rio de Janeiro, serviço do Professor Luiz Torres Barbosa, onde permaneceu por sete anos, sempre trabalhando com recém-nascidos.

Em 1965 foi nomeado médico da Maternidade Fernando Magalhães e em 1968 foi convidado a chefiar o berçário da UERJ, onde iniciou intensa carreira acadêmica. Acumulava duas chefias, desempenhando-se com grande maestria. Na UERJ tinha alunos de graduação e estagiários. Como todos quisessem ser seus estagiários, e não havia vagas suficientes, esses estagiários não se importavam em renunciar às camas e dormir no chão, para poder ter o privilegio de conviver com Nicola. Assim, sem mesmo se dar conta, estava fazendo uma escola de neonatologia.

Em 1972, a pedido dos médicos, passou a frequentar, graciosamente, o Instituto de Pediatria Martagão Gesteira, da UFRJ, para promover discussões de casos, e lá foi ficando. Em 1980 foi convidado a ser Professor colaborador na UFRJ e em 1982 foi efetivado como Professor assistente. Em 1984 defendeu sua tese e passou a Professor adjunto. Ficou na UFRJ até 1993, ano de sua morte.

Mas não foi apenas nessas instituições que trabalhou como chefe de berçário. Entre 1976-78 foi para o Instituto Fernandes Figueira e passou a se desdobrar para atuar em quatro instituições. Professor, adorado pelos alunos, despertava e incentivava neles a vontade de aprender. Sempre dava oportunidade aos mais novos e os ajudava em suas lides acadêmicas ou como recém-formadas. Foi paraninfo da turma que se denominou “Nicola Albano” e também patrono. Sua “escola de neonatologia” se consolidava e se firmava como especialidade. Em 1977, a convite do Professor de Obstetrícia Domingos Machado, foi para a Bahia e, durante 45 dias ajudou a montar o IPERBA, o primeiro Instituto de Perinatologia do Brasil. Montou a Unidade Neonatal, deixou as rotinas médicas e a infraestrutura para que o serviço pudesse crescer por si só.

Em 1978, juntamente com o Dr. Luiz Eduardo Vaz Miranda, seu ex-estagiário, montou um serviço novo: o Centro de Perinatologia do Rio de Janeiro, CEPERJ, com o qual sonhava desde há muito. Inicialmente localizado no hospital S. Vicente, lá permaneceu por quatro anos. Em 1982 veio, contudo, a realização completa do sonho: o CEPERJ autônomo, não somente assistencial, mas muito envolvido na produção científica e  no ensino a residentes do Rio de Janeiro, de outros estados e até mesmo internacionais, vindos da Colômbia, Uruguai e Perú. O CEPERJ organizou inúmeros cursos formadores de profissionais na especialidade e jornadas médicas. Cuidou, também, da área de enfermagem, promovendo cursos e treinamentos. Mas Nicola, sempre bem humorado e disposto, criava às vezes alguns problemas. Quando saia para fazer um transporte de recém-nascido (e nem sempre era propriamente o escalado, mas ia assim mesmo) chegando à instituição de onde o recém-nascido deveria ser transferido, acabava rodeado pela equipe local e, assediado pelo grupo, passava a dar aulas, a discutir outros casos, segundo as necessidades que se apresentavam. Havia que ter paciência…No CEPERJ, estruturou reuniões científicas semanais, consideradas prioritárias, e que deram origem ao que é hoje o “Centro de Estudos Nicola Albano”.

Tinha um compromisso com o ensino: percorreu o Brasil ensinando neonatologia. Participou de inúmeros congressos da especialidade, publicou inúmeros artigos e ganhou vários prêmios. Procurava sempre se atualizar, frequentando congressos e cursos no exterior, chegando a fazer, por 3 vezes, o “Board” de revisão em Neonatologia.

Mas não foi apenas o profissional e o professor dedicado.

Procurou, também, dar parte de seu tempo à Sociedade Brasileira de Pediatria. Ocupou todos os cargos possíveis: Presidente em 1978-80, foi Secretário, Presidente do Comitê de Neonatologia, Diretor de Cursos e Eventos, Diretor Científico, Vice-Presidente por duas vezes, Presidente de Congresso Brasileiro.

Tinha inúmeros planos para o futuro, inclusive um livro autobiográfico. Não chegou a terminá-lo. Aí veio a tragédia. Em 24 de outubro de 1993, Nicola parou. Estava entre amigos, dançando, e foi traído pelo coração. Ficou um imenso vazio. A vida continuou, mas nunca mais seria a mesma coisa...

Esta rara e preciosa figura humana não terá substituto.

Nicola Albano foi homenageado pela Sociedade de Pediatria do Estado do Rio de Janeiro e pela Sociedade Brasileira de Pediatria, sendo indicado como patrono da cadeira 29 de sua Academia Brasileira de Pediatria.

O Congresso Brasileiro de Perinatologia também homenageia Nicola Albano que dá nome ao prêmio atribuído ao melhor trabalho  do Congresso: “Prêmio Nicola Albano”.

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