O tema suicídio entre jovens está na programação da TV, nas séries e nos filmes, assim como nas redes sociais e, mesmo assim, precisamos falar cada vez mais sobre o assunto. Em reunião da Academia Brasileira de Pediatria, os professores Werther Carvalho e Jefferson Piva, responsáveis pelas UTI pediátricas de universidades de São Paulo e Rio Grande do Sul, enfatizavam o aumento de tentativas de suicídio em jovens e até em crianças menores de 10 anos que estavam sendo internadas em seus serviços. No Sabará Hospital Infantil, a psicóloga Dra. Cristina Borsari informa que tivemos aumento de 40% nos atendimentos de tentativa de suicídio no biênio 2021/2022 em comparação a 2019/2020. Tenho informação que o mesmo ocorre no Hospital Pequeno Príncipe, localizado em Curitiba e referência de Pediatria no Brasil.
Dados divulgados recentemente pelo jornal O Estado de São Paulo, obtidos no portal Datasus, mostram que quase 1300 crianças e adolescentes tiraram a própria vida em 2021, o maior número desde 1996. Em 2022, foram quase 1200 óbitos por suicídio nessa faixa etária, segundo dados preliminares divulgados pelo governo federal.
Segundo o boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, com dados até 2021, a taxa de suicídios cresceu 49% entre adolescentes de 15 a 19 anos entre 2016 e 2021, chegando a 6,6 óbitos por 100 mil habitantes. Já entre aqueles de 10 a 14 anos, embora a taxa seja menor (1,33), a alta foi igualmente preocupante (45%).
Já o Anuário Brasileiro de Segurança Pública do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, divulgado em 2023, houve 16.262 registros de suicídio no Brasil no ano de 2022. Dessa forma, tivemos 8 suicídios por 100 mil habitantes, uma elevação de 11,8% em relação a 2021, que registrou 7,2 casos por 100 mil habitantes. A grande preocupação é que os índices de suicídio seguem uma tendência de crescimento desde 2010. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil ocupa o 8º lugar entre os países com os maiores índices de suicídio.
Na Coreia do Sul, o suicídio é a principal causa de morte entre pessoas de 10 a 39 anos. Mais de duas em cada cinco mortes (44%) entre adolescentes no país são por suicídio. Já no Japão, de acordo com dados do Ministério da Saúde, Trabalho e Bem-Estar, em 2022, mais de 500 estudantes dos ensinos fundamental e médio cometeram suicídio. Numa viagem ao Japão, uma das pessoas com quem conversei por lá me disse que os jovens japoneses evitam ter relacionamentos, pois não sabem lidar com conflitos. Eles estão tão acostumados a viver no mundo virtual de jogos e ficção (nos quais, quando ocorre um problema, você deleta), que desaprenderam a buscar uma solução e acabam se isolando. Esses fatores podem levar à ideação suicida entre crianças e adolescentes, e isso fez com que aumentasse o número de atendimentos nos hospitais de casos de automutilação e de tentativa de suicídio, cujos dados são citados acima.
Há muitos anos, venho escrevendo sobre esse tema no Blog Saúde Infantil, ligado à nossa fundação. Só nesse Blog temos cerca de 50 artigos que citam o suicídio entre jovens e dez que tratam especificamente do assunto. Nos últimos tempos, a saúde mental das crianças e dos jovens vem sendo abalada e, entre as causas citadas pelos especialistas, estão o isolamento na pandemia, violência e negligência – em especial no ambiente familiar, incluindo o excesso de permissividade, o empobrecimento da relação dos jovens com pais e cuidadores e o uso excessivo da internet e das redes sociais.
O suicídio entre jovens é um problema de saúde pública em todo o mundo, é multifatorial, segundo os estudiosos do assunto. Além das mudanças e conflitos que costumam ocorrer nessa fase da vida, os jovens enfrentam cobranças e vivem o isolamento causado pelo uso excessivo das tecnologias.
Temos também um canal de vídeos, Saúde da Infância no YouTube, que tratam de problemas mentais como ansiedade, suicídio etc. Esses são campeões de visualizações.
Transtornos mentais como depressão e ansiedade, que podem ser causados por questões bioquímicas e hereditárias, além de fatores ambientais, também aumentam o risco de suicídio. Por isso, se a criança ou o adolescente manifestar sintomas compatíveis com esses quadros, deve ser levado(a) para avaliação médica ou psicológica e receber tratamento adequado, que geralmente inclui psicoterapia e medicações. A grande dica é conversar com seus filhos sobre todos os assuntos, mas não só no momento de conflito, diz a Dra. Cristina Borsari, psicóloga do Sabará Hospital Infantil.
Esse fenômeno fez com que adotássemos em nossa instituição um protocolo de prevenção de suicídio para todos os pacientes internados a partir dos dez anos, independentemente do motivo da internação. Para a nova unidade que estamos construindo, em São Paulo, também há previsão de leitos específicos para internação envolvendo casos de saúde mental, coisa impensável há alguns anos, quando os casos de internação de crianças e jovens com esse tipo de transtorno eram muito raros.
Vivemos em uma sociedade extremamente tecnológica, que tem grande carga de informação e é muito competitiva. Estes jovens são cobrados para terem atitudes de alta performance em diferentes áreas da vida: seja pela sua família, pela sociedade ou por eles próprios. Isso traz consequências emocionais que fazem com que o jovem entre em crise e conviva com as duas maiores doenças incapacitantes do mundo: a depressão e a ansiedade.
As situações que fazem que os jovens se sintam deslocados da sociedade, como o bullying, também passaram a tomar proporções maiores. Antigamente, o bullying era presencial. Hoje em dia, existe o cyberbullying, que tem divulgação imediata e “global”.
O isolamento é outro problema. Se você pega o metrô, as pessoas não se olham no vagão porque estão imersas em seus celulares. Estamos perdendo a sensibilidade do contato, do toque, do olho no olho, de sermos humanos, uns juntos aos outros, algo que descaracteriza as relações humanas e fragiliza as relações.
O problema é uma preocupação de saúde pública, e você pode conferir alguns sinais de alerta, segundo o Ministério da Saúde:
Segundo a OMS, 9 em cada 10 mortes por suicídio podem ser evitadas e a prevenção é fundamental. O assunto ainda é considerado tabu, mas é fundamental que em momentos difíceis as pessoas consigam pedir ajuda para familiares, amigos ou ao médico. Por essas razões, nós pediatras devemos estar atentos e incluir cada vez mais sobre esses assuntos nas consultas eletivas ou em ambiente de urgência, tendo como foco a saúde mental da criança e do adolescente.