Ciência e Ensino

Hesitação vacinal no Brasil: causas e consequências

Dr. Juarez Cunha
Membro do Departamento Científico de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP)


O valor das vacinas e da vacinação é inquestionável!

As vacinas são consideradas a maior conquista no campo da saúde pública e, segundo a OMS, evitam aproximadamente 3 milhões de mortes/ano no mundo. No Brasil, é calculado que contribuíram com o aumento de aproximadamente 30 anos na expectativa de vida.

Os benefícios da vacinação vão muito além da prevenção direta, protegendo também a coletividade. Frequentemente, se estendem ao longo da vida do vacinado, estabilizam os sistemas de saúde, pro- movem a igualdade na saúde e beneficiam as economias locais e nacionais.

Esses benefícios proporcionados pela vacinação à saúde pública são muito superiores que quaisquer das outras intervenções preventivas e curativas oferecidas

Qual a situação no Brasil?

Importante ressaltar o papel estratégico do nosso Programa Nacional de Imunizações, o PNI. São quase 50 anos que o tornaram referên- cia no Brasil e no mundo. Temos calendários vacinais para todas as faixas etárias e, provavelmente, os da infância e adolescência são os mais completos oferecidos gratuitamente no mundo.

O impacto das doenças imunopreveniveis (DIP) que tivemos no país impressiona: erradicamos a varíola, eliminamos a poliomielite, a rubéola, a síndrome da rubéola congênita e o tétano neonatal. O sarampo, que foi eliminado em 2016, retornou em 2018 como con- sequência das baixas coberturas vacinais, se mantendo com pou- cos casos até hoje. Todas as outras DIP que nosso PNI oferece vacinas nos seus calendários apresentam uma tendência importante de redução, como as doenças invasivas por Hemofilus Influenza B (HIb), meningococo e pneumococo, ou estão controladas, como a coqueluche.

Apesar disso, encontramos indivíduos, familiares e responsáveis, as- sim como profissionais da saúde, que hesitam em vacinar ou são con- tra as vacinas, e isso tem levado como consequência a baixas cober- turas vacinais. O exemplo do retorno do sarampo exemplifica o risco que as nossa população, em especial as crianças, estão correndo.

O que é hesitação vacinal?

Em 2019, a OMS lança um alerta com as 10 principais ameaças à saúde pública mundial, entre elas figurava a hesitação vacinal, definida como a recusa ou atraso em aplicar as vacinas recomendadas, apesar de sua disponibilidade nos serviços de saúde.

As baixas coberturas vacinais, que também têm sido observadas em todo o mundo, começaram a chamar a atenção no Brasil a partir de 2016, al- cançando seu pior momento em 2019, quando em nenhuma das vacinas aplicadas na infância atingi- mos as metas, que são: BCG e rotavírus 90% e as todas as outras 95%. Com a pandemia COVID-19 caíram mais anda, o que era esperado, já que no primeiro ano (2020) as medidas não farmacológi- cas incluíam uma série de restrições para a popu- lação e muitos tinham receio de ir aos postos de saúde. O que chama atenção em 2021 é que com o sucesso da campanha das vacinas COVID-19 no Brasil e no mundo, se imaginava que recuperaríamos as coberturas vacinais das outras vacinas, e, diferente dos outros países, no Brasil elas continuam decrescentes. Qual o motivo?

Entender hesitação em vacinar significa compreender as diferentes causas e determinantes envolvidos. São chamados os 3Cs, que na pan- demia foram acrescidos de mais dois.

Confiança

  • Na eficácia e segurança das vacinas
  • No sistema que os fornece, incluindo os serviços e profissionais de saúde
  • Recuperar a confiança e a efetividade do PNI (política estratégica de Estado)
  • As motivações dos formuladores de políticas que decidem sobre as vacinas necessárias

Complacência

  • Riscos percebidos de doenças evitáveis pe- las vacinas são baixos
  • Vacinação nem sempre é considerada uma ação preventiva necessária

Conveniência

    • Disponibilidade física, acessibilidade geográfica
    • Capacidade de compreensão (linguagem em saúde)
    • Valorização/capacitação profissional
    • Apelo dos serviços de imunização afeta a aceitação

Comunicação

    • Transmitir informação de forma adequada através das mídias sociais e de peças publicitárias
    • Combater a desinformação e as informações falsas

Contexto

    • Características sociodemográficas
    • Vulnerabilidades

Mensagem final

Sabemos as causas das baixas coberturas vacinais, assim como seus determinantes, suas consequências e o que precisa ser feito. O desafio é colocar tudo isso em prática! Cabe a nós, profissionais da saúde, com conhecimento e uma adequada comunicação, oferecer informações e orientações corretas para ajudar a reverter esse quadro.

Bibliografia consultada:

  • Programa Nacional de Imunizações (PNI): 40 anos

/ Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância Epidemiológica.

– Brasília: Ministério da Saúde, 2013.

  • Guia de Vigilância em Saúde [recurso eletrônico]

/ Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde. Coordenação-Geral de Desenvolvimento da Epidemiologia em Serviços. – 5. ed. – Brasília:

Ministério da Saúde, 2021. 1.126 p.: il