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Artrite idiopática juvenil subtipo oligoarticular

Publicado/atualizado: outubro/2022

Departamento Científico de Reumatologia

  • O que é artrite idiopática juvenil?

A artrite idiopática juvenil (AIJ) é uma doença articular inflamatória crônica, ou seja, acomete principalmente as juntas (articulações), e tem duração prolongada, sendo a doença articular inflamatória crônica que mais atinge crianças ou adolescentes. Ainda não se sabe a causa da AIJ, mas admite-se a possibilidade de que alguns indivíduos possuam uma tendência genética a desenvolver uma alteração do sistema de defesa do corpo (sistema imune) que pode ocorrer após um trauma articular, infecção ou alterações hormonais ou psicológicas.

  • AIJ oligoarticular é subtipo de AIJ?

AIJ é um termo bastante abrangente para designar algumas doenças que têm estas principais características em comum: presença de artrite crônica, início dos sintomas antes de completar 16 anos e ausência de causa bem estabelecida. No entanto, a forma oligoarticular é apenas um dos sete subtipos diferentes de AIJ.  A forma mais comum, compreendendo cerca de 30 a 50% do número total de casos de AIJ.

A palavra “oligo” provém da língua grega e dá ideia de “pouco”. Por isso, a AIJ é classificada como oligoarticular quando, nos primeiros seis meses de doença, acomete no máximo quatro articulações.  Após os primeiros seis meses, a AIJ oligoarticular pode ter dois tipos de evolução: continuar com até 4 articulações comprometidas (curso persistente) ou acometer 5 ou mais articulações (curso estendido).

  • Tem pacientes que possuem maior chance de desenvolver AIJ oligoarticular?

A AIJ oligoarticular predomina no sexo feminino, podendo atingir uma proporção de até 4 meninas para um menino e ocorre predominantemente em crianças com idade menor ou igual a seis anos, principalmente naquelas com um a três anos. Pacientes que possuem familiares com AIJ ou outras doenças autoimunes também apresentam uma maior chance de desenvolver essa condição.

  • Quais são as manifestações da AIJ oligoarticular?

A principal manifestação clínica da AIJ oligoarticular é a artrite, a qual manifesta-se com dor, inchaço, calor e limitação do movimento em uma ou até quatro articulações. Nem sempre a criança ou o adolescente se queixa de dor, pois habitualmente inchaço e calor locais são mais importantes do que a dor. Muitas vezes, o responsável é quem percebe que a criança está com a marcha diferente, mancando, pedindo muito colo, deixando de brincar ou mudando o tipo habitual de brincadeiras. As articulações mais atingidas pela AIJ oligoarticular são joelhos e tornozelos e, em até metade dos casos, só haverá artrite de uma única articulação. Uma característica marcante da inflamação articular nestes casos é a rigidez matinal (ao acordar) ou após repouso, fazendo com que as articulações fiquem duras e com menor capacidade de se movimentar, podendo causar bastante limitação para a realização de atividades de vida diária.

  • A AIJ oligoarticular pode afetar outros órgãos além das articulações?

Sim. As crianças com AIJ oligoarticular possuem um risco aumentado de desenvolver uveíte anterior crônica ou iridociclite, que é a inflamação da íris e do corpo ciliar, estruturas anatômicas que fazem parte do segmento anterior dos olhos. Pode afetar somente um olho, porém é mais comum ter inflamação nos dois olhos. Há maior risco de aparecimento dessa complicação nos dois primeiros anos de evolução da doença em meninas, menores de 6 anos ou que possuem o exame do fator antinúcleo (FAN) positivo.

A uveíte anterior crônica é assintomática, ou seja, geralmente não causa nenhum sintoma (olho vermelho, coceira ou lacrimejamento). Entretanto, se não for tratada adequadamente, pode trazer consequências graves, como catarata, glaucoma (aumento da pressão intraocular) e inclusive cegueira. Por isso, é muito importante que essas crianças sejam avaliadas precocemente por um médico oftalmologista, especialmente aquelas com FAN positivo, que iniciam a AIJ antes dos 6 anos de idade e com pouco tempo de evolução da doença.

  • Como se faz o diagnóstico da AIJ oligoarticular?

O diagnóstico é feito de acordo com critérios da Liga Internacional de Associações para a Reumatologia (do inglês “International League of Associations for Rheumatology” - ILAR) e requer a presença de artrite com duração mínima de seis semanas (artrite crônica) em pelo menos uma articulação. Nos primeiros seis meses de doença, o número de articulações inflamadas não pode ser superior a quatro. Também é essencial que não preencha critérios para nenhum dos outros seis subtipos de AIJ. Não há nenhum exame laboratorial que confirme o diagnóstico, porém eles são necessários para exclusão de outras doenças. Após receber o diagnóstico, as crianças devem iniciar o tratamento adequado e comparecer regularmente às consultas com o reumatologista pediátrico e com o oftalmologista, para melhor tratamento, controle e evitar complicações.

  • Como é realizado o tratamento da AIJ oligoarticular?

As decisões relativas ao tratamento da AIJ oligoarticular devem ser realizadas pelo médico em conjunto com os pais. Os objetivos são: diminuição da dor, manutenção da amplitude de movimento das articulações, prevenção de deformidades, melhora da qualidade de vida e otimização da participação social. Estes são mais facilmente obtidos quando se dispõe de uma equipe multidisciplinar, de acordo com a necessidade de cada criança (fisioterapeuta, dentista, psicólogo, terapeuta ocupacional, ortopedista, nutricionista, entre outros).  

Em relação ao tratamento medicamentoso, a primeira linha recomendada são os anti-inflamatórios não esteroidais (AINE). Quando existem uma ou duas articulações comprometidas, há a possibilidade de se realizar a infiltração local (na articulação) de glicocorticoide. Essa forma de administração de medicação pode até evitar que o paciente precise tomar quaisquer outras medicações.

Caso dentro de 2 a 3 meses os AINEs ou os glicocorticoides locais não sejam suficientes para deixar a criança sem nenhuma artrite e com os exames laboratoriais completamente normais (remissão da doença), o especialista que está acompanhando a criança poderá indicar medicamentos modificadores do curso de doença (MMCD). Além disso, na presença de fatores de pior evolução (artrite de coluna cervical, quadril, punho ou tornozelo; contraturas articulares), os MMCD devem ser iniciados ainda mais cedo mais precocemente. Se a criança persistir com sintomas, o médico pode lançar mão de medicações imunobiológicas.

Quando existe o comprometimento ocular, o tratamento pode requerer o uso de colírio com glicocorticoide, prescrito pelo oftalmologista. Por isso, é de suma importância que essas crianças sejam avaliadas regularmente tanto na época do  diagnóstico, como em consultas periódicas.

  • O que pode acontecer se não tratar corretamente? Há risco de complicações?

A doença pode deixar sequelas (defeitos permanentes em algumas estruturas) quando não for bem controlada, seja por falha ou não realização do tratamento correto. Devido ao desgaste causado pela inflamação contínua, as articulações podem perder gradualmente a amplitude de movimento, em alguns casos chegando a perdê-lo completamente, podendo até necessitar de procedimento cirúrgico. A inflamação articular persistente pode ainda comprometer o crescimento da criança, levando à baixa estatura ou mesmo alterações do tamanho dos membros superiores ou inferiores. As manifestações oculares, quando não tratadas, podem evoluir até para a cegueira.

  • A AIJ oligoarticular tem cura? É preciso tomar remédio a vida inteira?

A AIJ oligoarticular é uma doença crônica e até o momento não tem cura. Isso não significa que todas as crianças e adolescentes que possuem AIJ oligoarticular vão precisar de medicações durante a vida toda. Muitos dos pacientes entram em remissão da doença por um tempo prolongado e são possíveis candidatos a terem as suas medicações suspensas ao longo do seguimento ambulatorial. Entretanto, o alcance da remissão não garante que não haja reativação após um período variável de tempo. Por outro lado, outros podem ter uma doença mais grave e de mais difícil controle, necessitando assim de medicações até durante a vida adulta. Assim sendo, o acompanhamento com reumatologista pediátrico é fundamental.