Publicado/atualizado: junho/2024
Departamento Científico de Hepatologia
A atresia de vias biliares (AVB) é uma doença do fígado e ductos biliares que ocorre em recém-nascidos. As células do fígado produzem um líquido chamado bile, que ajuda na digestão de gorduras e carrega algumas substâncias para serem eliminadas pelo intestino através de ductos biliares. Na AVB ocorre uma inflamação destes ductos, levando a uma obstrução progressiva dos mesmos. A bile fica retida no fígado, provocando rapidamente dano hepático, que pode evoluir para cirrose e óbito, caso não seja tratada precocemente. É a causa mais comum de transplante hepático em crianças.
As causas ainda não são completamente conhecidas. Em alguns casos, os ductos biliares não se desenvolvem adequadamente durante a gestação. Em outros, ocorre uma inflamação dos ductos biliares devido a uma agressão do sistema imune.
Os recém-nascidos com AVB apresentam icterícia (pele e olhos amarelados), urina que mancha a fralda (colúria) e fezes esbranquiçadas ou acinzentadas (acolia) ou amarelo pálido (hipocolia fecal). Os sintomas podem surgir já nos primeiros dias de vida, entretanto as vezes a hipocolia demora para surgir. Se o diagnóstico não é realizado pode evoluir para falência hepática e morte precoce. Dez a 20% dos bebês podem ter malformações em outros órgãos, como coração, baço e intestinos.
O primeiro passo diante de uma criança que permanece ictérica após os quatorze dias de vida é solicitar a dosagem das bilirrubinas (direta e indireta). A icterícia fisiológica, que comumente aparece nos recém-nascidos na primeira semana de vida é à custa da bilirrubina indireta (BI). Se ao invés da BI, a bilirrubina direta (BD) estiver aumentada, sempre é doença hepática ou biliar. Como no início do quadro a criança encontra-se, habitualmente, em bom estado geral e com peso adequado, muitas vezes a icterícia leve é negligenciada e o diagnóstico feito tardiamente.
Enfatiza-se a importância da observação da cor das fezes dos bebês e a identificação de acolia ou hipocolia fecal. Na caderneta de saúde da criança do ministério da saúde existe uma escala colorimétrica que pode ajudar na identificação.
Uma série de exames devem ser solicitados para tentar identificar a causa. Dentre eles exames de sangue, urina, ultrassom de fígado e vias biliares (sempre com a criança em jejum) e biópsia hepática. Se houver suspeita de AVB o bebê deve ser rapidamente encaminhado para cirurgião pediátrico para cirurgia e realizar colangiografia transoperatória. É injetado um contraste na vesícula biliar para avaliar os ductos biliares. A AVB é um quadro que representa uma urgência e é fundamental a identificação precoce pelo pediatra. A investigação deve ser feita em serviço especializado.
Através de uma cirurgia chamada portoenterostomia, também conhecida como “técnica de Kasai”. Deve ser realizada o mais precocemente possível, de preferência até seis a oito semanas de vida, antes de ocorrer à formação do tecido cicatricial no fígado. Se a cirurgia não for realizada, a doença é sempre fatal. Uma alça do intestino delgado é conectada ao fígado. Isso faz com que a bile passe diretamente do fígado para o intestino.
A cirurgia não cura a atresia biliar, mas ajuda o fluxo de bile de volta ao intestino e reduz a sobrecarga hepática. Mesmo quando a operação é bem sucedida, cerca de metade dos bebês continuam a ter uma piora na doença hepática, desenvolvendo cirrose, precisando eventualmente de um transplante hepático. No caso de bebês que não podem passar por essa operação, eles em geral precisam de um transplante de fígado até os dois anos de idade.