Publicado/atualizado: outubro/2022
Departamento Científico de Reumatologia
Uveíte anterior ou iridociclite é a inflamação da íris e do corpo ciliar, que constituem a úvea. É rara na infância e pode ocorrer em um ou nos dois olhos sendo classificada, de acordo com o local do olho, em anterior, intermediária ou posterior. Na criança a mais comum é a anterior (39% a 78%). Dependendo do tempo de evolução da doença, a uveíte pode ser classificada em aguda, recorrente ou crônica. O diagnóstico e o tratamento precoces são importantes para evitar complicações graves, inclusive a perda da visão.
As uveítes são uma condição rara na infância, entretanto, podem ser graves e ocasionarem complicações em 30% a 60% dos pacientes e cegueira em 7% a 23%. As uveítes na infância acometem de 5 e 30/100.000 crianças e adolescentes na Europa e nos Estados Unidos, respectivamente. O início das uveítes, geralmente, ocorre dos 7 aos 12 anos.
Em relação ao sexo os dados da literatura são conflitantes. Em alguns países da Escandinávia, na Índia e na Arábia Saudita há predomínio do sexo masculino, enquanto que na América do Sul, no norte dos Estados Unidos e em países da Europa e da Ásia, as meninas são mais comprometidas.
As uveítes podem ser parte dos sinais de uma doença sistêmica ou ocorrer como um processo ocular isolado. Dentre as causas mais comuns temos as infecciosas, por bactérias, fungos, vírus, helmintos e protozoários, e as autoimunes, geralmente associadas a uma doença de base. Entretanto, a grande maioria das uveítes da infância é de causa não infecciosa. Dentre as doenças autoimunes a Artrite Idiopática Juvenil (AIJ) é a causa mais frequente (9,3% a 47,9%). Mas é importante lembrarmos que outras doenças autoimunes podem causar uveíte. Há também a uveíte idiopática, quando não se encontra uma causa definida, o que ocorre em cerca de 50% dos casos.
As manifestações das uveítes dependem do tipo e da parte do olho onde se localiza o processo inflamatório. Os sintomas da uveíte são dor ocular, vermelhidão, hipópio (precipitação de pus na câmara anterior), lacrimejamento excessivo, dificuldade para olhar a luz, escotomas, que são manchinhas como moscas que o paciente vai perceber ilusoriamente e visão turva. A grande dificuldade para o seu diagnóstico está relacionada com a ausência de sintomas que ocorre na grande maioria das crianças e adolescentes, mesmo com a visão comprometida, sendo diagnosticada tardiamente, após complicações estruturais se desenvolverem. Além disso, crianças são menos capazes de referirem sintomas visuais sutis quando comparadas aos adultos. A avaliação oftalmológica é, portanto, de grande importância na presença de queixas oculares. Ademais, é rotineiramente indicada aos 12 meses de vida e após a cada 1-2 anos para prevenção de ambliopia, mesmo na ausência de queixas ou alterações locais.
O diagnóstico da uveíte é feito através de exame oftalmológico com lâmpada de fenda, a biomicroscopia das câmaras oculares. O principal achado indicativo de uveíte neste exame é a reação ocular com presença de células inflamatórias presentes no liquido da câmara anterior do olho na menina dos olhos. É importante determinar se a inflamação é parte da apresentação de uma doença sistêmica ou um processo ocular isolado. Exames como - hemograma completo, velocidade de hemossedimentação, proteína C reativa e exame de urina simples - fazem parte da avaliação geral. Causas infecciosas devem ser investigadas através de exames mais específicos. Para investigação de doenças autoimunes os exames do HLA-B27 e do fator antinuclear (FAN) poderão auxiliar na confirmação de uma doença de base como a espondilite anquilosante ou a AIJ. Crianças com AIJ e FAN positivo estão mais propensas a apresentar uveíte anterior crônica. Exames de imagem, por exemplo, o raio x simples, a ecografia e a ressonância magnética, também podem ser necessários na investigação.
O tratamento das uveítes infecciosas é direcionado para a infecção. Nas uveítes de causa autoimune: primária ou idiopática e secundária à doença reumática, utiliza-se inicialmente os glicocorticóides tópicos, ou gotas oftálmicas que são medicamentos derivados da cortisona. Nos casos em que não há uma boa resposta ao tratamento local, os glicocorticoides por via oral, estão indicados, preferencialmente, por um curto período. Os imunossupressores, como o metotrexate e a ciclosporina A, podem ser necessários para controlar o processo inflamatório do olho, diminuindo o uso de glicocorticoide oral, que pode acarretar efeitos colaterais ruins quando usado por muito tempo. Nos poucos casos que não respondem aos imunossupressores pode ser necessária a utilização de medicações de última geração, denominadas biológicos, como o adalimumabe, o infliximabe, o tocilizumabe, abatacepte e inibidores de janus kinase (baracitinibe, tofacitinibe).