Entrevista

“Aleitamento materno: a base da vida”

Dra. Elsa Giugliani, presidente do Departamento Científico de Aleitamento Materno.

Enquanto ocorrem os trâmites no Congresso e no Senado para aprovação da ampliação da licença-maternidade de quatro para seis meses, outras leis têm ajudado a consolidar a importância do aleitamento materno. Uma delas foi a Lei nº 11.265/2006, que trata da comercialização de alimentos para lactentes e crianças de primeira infância e também de produtos de puericultura correlatos (NBCAL), que levou nove anos para ser regulamentada.

Em entrevista ao SBP AmamentAÇÃO, a presidente do Departamento Científico de Aleitamento Materno da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), dra. Elsa Giugliani, acredita que aprovação da lei da ampliação da licença-maternidade é uma questão de tempo e de isonomia, uma vez que as trabalhadoras dos serviços públicos federal, estaduais, municipais e até de algumas empresas privadas já têm esse privilégio.

“A recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) de aleitamento materno exclusivo nos primeiros seis meses é difícil de ser cumprida se a mulher tem que voltar a trabalhar após quatro meses. Isso sem falar nas mulheres com emprego informal”, explica.

Na conversa, dra. Elsa afirma que a comemoração da SMAM e do Agosto Dourado contribui para aumentar a consciência sobre a importância da amamentação e da necessidade de apoio de todos, não apenas da mulher.  Para ela, esse tema deve envolver patrões, famílias, governos, enfim, é uma responsabilidade de toda a sociedade.

Segundo a especialista, tornou-se uma tradição da atual gestão da SBP de se ofertar aos pediatras uma série de ações pró-aleitamento materno no mês de agosto. “Uma grande novidade para este ano foi o curso de Ensino à Distância (EAD) sobre aleitamento materno, cuidadosamente elaborado, com a participação de professores altamente qualificados e conhecedores do tema, demonstrando o comprometimento da instituição na promoção, proteção e apoio ao aleitamento materno. Além disso, os pediatras receberam 31 temas interdisciplinares, três documentos científicos e sete podcasts sobre a temática”, enumera.

Leia a seguir a íntegra da entrevista.

SBP AmamentAÇÃO – “Aleitamento materno é a base da vida” foi o tema definido neste ano pela Waba. Qual seu significado?

Dra. Elsa Giugliani – Esse tema fala, basicamente, sobre a importância do aleitamento materno para a saúde do indivíduo durante toda a sua vida. Essa é a mensagem principal. Algumas pessoas podem acreditar que os benefícios do aleitamento materno se dão somente enquanto a criança está sendo amamentada, porém, o tema deste ano chama a atenção para o fato de que alguns desses benefícios permanecem ao longo da existência. Podemos comparar com um prédio, por exemplo. Se uma construção não tem um alicerce sólido, as paredes e o teto podem ficar instáveis e até ruir. Daí a importância de se ter fundações bem estruturadas para as obras ficarem mais seguras. Podemos aplicar essa mesma ideia para o aleitamento materno. Os estudos mostram que o aleitamento não natural fragiliza o sistema imunológico, colocando em maior risco os indivíduos não amamentados, ou amamentados por pouco tempo, de desenvolverem uma série de doenças. Mas essa base da vida não se restringe apenas aos aspectos relacionados à saúde física. A amamentação também está relacionada a uma melhor saúde mental, à proteção do planeta - na medida em que é um alimento ecológico, sustentável, que não agride o meio ambiente - e, ainda, à promoção da equidade, na medida em que independe de investimento financeiro do indivíduo. A amamentação é um dos poucos comportamentos positivos em saúde mais prevalente nos países de baixa e média renda do que nos países de alta renda. Na ausência da amamentação a desigualdade em saúde, sobretudo na mortalidade infantil, seria ainda maior.

SBP AmamentAÇÃO – Com base no tema deste ano, quais as contribuições que os pediatras podem dar para promoção do aleitamento no Agosto Dourado e nos outros meses do ano?

Dra. Elsa Giugliani – A contribuição mais importante é promover, proteger e apoiar o aleitamento materno na sua prática diária. Para isso, o profissional tem que ter conhecimento sobre os diversos aspectos do aleitamento materno, ter atitudes positivas e certas habilidades. Ou seja, o pediatra deve se preparar e se atualizar continuamente. O tema deste ano, sem dúvida, contribui para manter acesa a motivação dos pediatras para promover o aleitamento materno. É interessante observar que a população, na medida em que está mais conscientizada da importância do aleitamento materno, está exigindo uma atitude favorável dos pediatras ao aleitamento materno. Há vários relatos de famílias que têm trocado de pediatra por eles/elas não corresponderem às expectativas quanto ao apoio à amamentação.

SBP AmamentAÇÃO – Neste ano, o DCAM-SBP preparou uma série de ações para comemorar o Agosto Dourado. Como avalia o sucesso da campanha?

Dra. Elsa Giugliani – Tornou-se uma tradição a atual gestão da SBP ofertar aos pediatras uma série de ações pró-aleitamento materno no mês de agosto. Nos preparamos durante todo o ano para isso. Uma grande novidade em 2018 foi o curso de ensino à distância (EAD) sobre aleitamento materno, cuidadosamente elaborado com a participação de professores altamente qualificados e conhecedores do tema. Isso mostra o comprometimento da SBP na promoção, proteção e apoio ao aleitamento materno. No ano passado, oferecemos 31 razões para amamentar, uma por dia durante todo o mês de agosto. Já em 2018, seguindo na mesma linha, selecionamos 31 artigos publicados recentemente, com interface com 31 departamentos científicos da SBP (excluindo o de Aleitamento Materno). Assim, para cada dia do Mês Dourado, foi disponibilizado o resumo de um artigo selecionado, com interface em um dos departamentos científicos. Além disso, disponibilizamos três documentos científicos. O primeiro foi “Amamentação: a base da vida”, onde fundamentamos com evidências científicas o tema da SMAM deste ano. Tivemos ainda os documentos científicos “Amamentação e sexualidade” e “Consultório Amigo da Amamentação”, este último com o objetivo de orientar os pediatras sobre como proceder para que o seu ambiente de atendimento e trabalho seja considerado "amigo da amamentação”.

SBP AmamentAÇÃO – Projetos de Lei sobre a ampliação da licença-maternidade para 180 dias ainda seguem em tramitação no Congresso Nacional. Na sua opinião, o que falta para sua aprovação?

Dra. Elsa Giugliani – Os grupos que se sentem prejudicados com esse projeto fazem lobby com os políticos contra essas propostas. Recentemente, tivemos a experiência da aprovação e regulamentação da Lei nº 11.265/2006, que trata da comercialização de alimentos para lactentes e crianças de primeira infância e também de produtos de puericultura correlatos (NBCAL), que levou nove anos para ser regulamentada, já que existia, por um lado, um lobby muito forte das indústrias que se sentiam prejudicadas. A mesma resistência acontece contra as leis que tratam do aleitamento entre os empregadores, que desconhecem os benefícios da ampliação da licença-maternidade, inclusive para as empresas. No entanto, acredito que a aprovação dessas normas seja uma questão de tempo, uma vez que as trabalhadoras dos serviços públicos federal, estaduais, municipais e até de algumas empresas privadas que aderem ao “Programa Empresa Cidadã” já têm esse privilégio. É uma questão de isonomia.  A aprovação dessa lei será um grande avanço, em que todo mundo ganha: em primeiro lugar as mulheres e seus bebês, as famílias, a sociedade em geral e, inclusive, as próprias empresas. A recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) de aleitamento materno exclusivo nos primeiros seis meses é difícil de ser cumprida se a mulher tem que voltar a trabalhar após quatro meses. Isso sem falar nas mulheres com emprego informal. Nesse sentido, a comemoração da SMAM e do Agosto Dourado só tem a contribuir para aumentar a consciência de todos de que a amamentação é muito importante e não depende somente da mulher. Esse tema envolve todos: patrões, famílias, governos. Enfim, é uma responsabilidade de todos.

SBP AmamentAÇÃO – Recentemente em Santo André, na Região do ABC Paulista, uma mãe foi impedida por dois seguranças de amamentar no terminal rodoviário enquanto esperava o ônibus. No entanto, sabemos que não há lei que proíba a mulher de amamentar em locais públicos. Qual o papel da sociedade civil na promoção e incentivo ao aleitamento materno e o que falta para que todos os cidadãos tenham consciência sobre os benefícios do aleitamento materno e do direito à amamentação em livre demanda?

Dra. Elsa Giugliani – Comparando o Brasil a outros países sobre essa questão de proibição de amamentar em público, sobretudo aos países ocidentais de alta renda, estamos em melhor posição. Não existe lei que proíba a amamentação em público. Pelo contrário, existe um forte movimento contra esses abusos, como o que ocorreu em Santo André. Infelizmente algumas pessoas ainda se sentem incomodadas em ver uma mulher amamentando. Mas, na medida em que se trabalha o aleitamento materno com as inúmeras atividades que vêm acontecendo a cada ano, esse tipo de atitude tende a diminuir. Nesse sentido, a SBP e suas filiadas estão contribuindo muito ao intensificar as ações pró-aleitamento materno, aumentando a conscientização dos pediatras e da população em geral de que essa prática é algo natural, esperada e desejada, e que, além de tudo, é um direito da mulher e da criança. Seria incoerente recomendar aleitamento exclusivo sob livre demanda se a criança não pudesse ser amamentada em qualquer hora e local, independentemente de ser em local público. É interessante comentar que o documento científico sobre “amamentação e sexualidade”, disponibilizado neste Agosto Dourado, contribui para desfazer o tabu de que não se deve amamentar em público.

SBP AmamentAÇÃO – Como vê essa relação dos especialistas em aleitamento materno com a mídia a fim de se promover o aleitamento materno?

Dra. Elsa Giugliani – É muito importante esse relacionamento entre os pediatras e a mídia. Durante a campanha do Agosto Dourado, os membros do DCAM-SBP e das filiadas ficaram extremamente ocupados participando de eventos, inclusive de vários mamaços, concedendo entrevistas em veículos nacionais e locais. Vejo esse envolvimento crescente de forma geral e, em especial, por parte da SBP. Sempre que o pediatra tiver oportunidade de conceder entrevistas, se manifestar nas redes sociais e participar de ações pró-aleitamento materno é de extrema importância o uso dessas poderosas ferramentas de interação com público.


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