Professor titular da UnB e presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria
Os hospitais universitários estão mais enfermos que os doentes por eles atendidos. Padecem de deficiências crônicas aparentemente irreversíveis. Arrastam-se entre falências múltiplas dos órgãos administrativos de que dependem. Mostram sinais de depressão orçamentária progressiva. Alimentam-se de um modelo de gestão indigesto, responsável por efeitos colaterais produzidos por instâncias nocivas à saúde institucional. Seu organismo, carcomido pela necrose do abandono, revela paralisias diversas que o imobilizam. Perdem força, debilitam-se, não resistem aos agravos econômicos e financeiros que lhes retiram estabilidade. Sobrevivem na estagnação geral, véspera do coma. Os raros indícios de recuperação são ilusórios. Não passam de espasmos próprios do processo de asfixia. São entes quase terminais.
A precariedade dos hospitais universitários é a cara do país real. Pouco investimento para formar gente e dinheiro de sobra para manter indigentes. Nenhuma prioridade para enriquecimento cerebral da nação. Primazia apenas para a obesidade bancária, os superávits sem finalidade social, a classificação de baixo risco para quem investe dinheiro no país e o alto risco para quem insiste em viver nele.
A degradação dos centros formadores de profissionais de saúde não é de agora. É de décadas. Muito descaso e total descuido com a valorização dos recursos humanos são marcas de sucessivos governos. Todos contribuíram para o impasse. Nenhum ousou romper com o atraso para sair do imobilismo da gestão estatal, incompatível com os desafios de uma atividade que tem a ver diretamente com a vida. O povo paga o preço. Prejudica-se a qualidade dos serviços prestados. Degenera-se o campo de estágio acadêmico para a formação de alunos dos diversos cursos de graduação no domínio das ciências da saúde. Esvazia-se a pesquisa, míngua a produção nacional de conhecimentos científicos. O país permanece na condição de mero consumidor de tecnologias geradas por estrangeiros. Continua acomodado na posição de economia periférica.
Há, ademais, uma militância corporativa em saúde pública cuja mentalidade não avança. Nem admite que se avance. Quer o triunfo de idéias e modelos vencidos pelo tempo, envelhecidos pela idade, superados pela dinâmica evolutiva da história. Seus membros são dogmáticos nas teses defendidas, intolerantes nas divergências enfrentadas. Impedem a diferenciação qualitativa do SUS, persistindo no fundamentalismo que só concebe a administração da saúde pública com a estreiteza de uma seita religiosa, completamente fechada a mudanças. São responsáveis pela decadência dos serviços de saúde dispensados à maioria do povo. Vangloriam-se de indicadores quantitativos para avaliar ações cuja eficácia supõe rigor qualitativo inegociável. Comprazem-se no exercício do auto-engano, prática em que se superam e se bastam.
A agonia dos hospitais universitários é desastre anunciado. Os recursos que recebem do SUS são ridículos diante da dimensão dos objetivos a realizar. Uma espécie de bolsa hospital. Não pagam o custo mínimo de um verdadeiro hospital universitário. Daí as crises que se repetem, os prédios que afundam — como o pronto socorro do Hospital Universitário de Brasília —, os equipamentos sem manutenção, os elevadores quebrados, os laboratórios sem reagentes, as ambulâncias paradas, a limpeza precária, a escassez de médicos, a carência de enfermeiros, os pacientes amontoados em corredores, o estresse a governar os servidores em geral e a impotência administrativa a neutralizar a ação dos diretores. O retrato sem retoque de uma realidade que não tem mais como se sustentar.
Os hospitais universitários acumularam dívida de R$ 400 milhões. É o limite da sobrevivência. A nobre função que exercem exige virada radical no modelo de gestão. E não há que reinventar a roda. Basta ver, sem preconceitos, como funcionam nos países desenvolvidos. Não se trata de copiar o que se faz lá fora. Apenas perceber que é possível gerir um hospital universitário na lógica das instituições públicas não estatais.
O ministro Temporão defende a mudança. Tem a visão do sanitarista moderno. Defende as fundações públicas de direito privado e o instrumento do contrato de gestão para dar autonomia gerencial a hospitais públicos. No Brasil, há experiências bem-sucedidas dessa modalidade de gestão. É a única alternativa para revitalizar instituições estatais agonizantes no campo da saúde. O destino do hospital universitário brasileiro não pode ser a mediocridade.
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