A depressão na infância e adolescência tem sido foco de estudos internacionais devido ao aumento de sua prevalência nos últimos anos. Além disso, pesquisas recentes relacionam a depressão na vida adulta com fatores de risco na gestação e na primeira infância. O tema foi abordado no novo documento científico produzido pelo Departamento Científico de Desenvolvimento e Comportamento da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).
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Embora a prevalência real da depressão ainda seja desconhecida no Brasil, estima-se que a doença está se tornando um problema de saúde pública, pois dados de tentativas ou consumação de suicídios têm aumentado na adolescência e em idade cada vez mais precoce. Estudo realizado na cidade de Recife, por exemplo, demonstrou que as prevalências de sintomas depressivos expressivos e de ansiedade se igualaram a 59,9% e 19,9%, respectivamente, em adolescentes de 14 a 16 anos naquela capital.
“Na adolescência, o jovem pode apresentar isolamento social, ficar muito no quarto, não querer interagir com os pais, com os amigos. Esses sintomas muitas vezes são confundidos. Os pais precisam perceber quando passa da normalidade ou quando gera sofrimento, prejuízo social e emocional para esse adolescente. Esse é o gatilho para entender que esse adolescente está em risco ou que ele realmente está com quadro de depressão”, alerta a presidente do departamento, dra. Liubiana Arantes de Araújo.
DIAGNÓSTICO – Em geral, o diagnóstico segue os critérios descritos no Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais (DSM–V), mas destaca-se que estes foram delineados para a depressão na população adulta e que os sinais e sintomas podem ser diferentes na infância e adolescência.
Dentre os fatores de risco para a depressão em pediatria pode-se citar problemas emocionais graves durante a gestação; história família de depressão ou transtornos psiquiátricos; tentativa de suicídio em parente próximo; depressão materna; estresse tóxico na infância, incluindo agressões físicas, morais e verbais; excesso de cobrança, abuso sexual; entre outros.
Também estão entre os fatores de risco o cyberbullying; a exposição excessiva às telas, como televisão, tablets e celulares; exposição a conteúdos inadequados ou violentos (através de games, vídeos, filmes, desenhos e mensagens de texto); quadro de ansiedade excessiva; privação crônica de sono devido a horários inadequados de dormir e despertar e quantidade insuficiente de horas de sono pela faixa etária; terceirização da infância com redução do tempo de presença dos pais; oportunidades de brincadeiras restritas; pouca convivência com os pares; e o tempo ao ar livre e brincadeiras na natureza limitadas.
SINTOMAS – No geral, podemos surgir sinais e sintomas como o sentimento de culpa ou baixa autoestima; dificuldade de tomar decisões; distúrbios do sono, como sonolência excessiva, insônia, despertar precoce; humor deprimido, apatia; desinteresse pelas atividades habituais e por brincadeiras; redução da energia ou irritabilidade/agitação; dificuldade de concentração; alterações do apetite, desde hiperfagia à anorexia e alterações do peso; agitação psicomotora ou lentidão; pensamentos suicidas, comportamento de auto injúria.
Estes sintomas devem estar presentes por mais de duas semanas e acarretar prejuízo funcional ou social. Já em crianças menores de 12 anos, sintomas inespecíficos podem ocorrer, como queixas somáticas – dor abdominal, cefaleia, náuseas, dores em membros inferiores; choro fácil; comportamento de roer unhas ou morder lápis, mutismo seletivo abrupto, maneirismos e tiques; além de distúrbios do sono; recusa em ir à escola; dificuldades escolares; e comportamento opositor.
“Diante da suspeita, torna-se essencial investigar o comportamento da criança em outros ambientes, como na escola, nas atividades extras e em casas de familiares e amigos. A depressão pode apresentar comorbidades, como quadros de transtorno de ansiedade, abuso de substâncias (álcool e drogas ilícitas), transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, transtorno opositor desafiador, transtorno de conduta, dentre outros”, advertem os especialistas.
PREVENÇÃO – O pediatra deve investigar em toda consulta questões relacionadas ao quadro comportamental e emocional da criança e adolescente. Conversar sobre seu estado de humor e sobre os seus sentimentos deve fazer parte da consulta, assim como a investigação de uma rotina inadequada ou de indicativos de estresse tóxico e fatores de risco para depressão e transtornos psiquiátricos.
Diante de uma criança em risco, deve ser instituída a organização da rotina de sono, com horário e tempo satisfatórios por idade; estabelecer o tempo e conteúdo de tela, de acordo com as recomendações por idade; realizar brincadeiras ao ar livre; tempo qualitativo com os pais; orientações a escola; atividades físicas durante cerca de 60 minutos ao dia; atividades de lazer; técnicas de relaxamento ou “mindfulness”.
TRATAMENTO – Para as crianças com diagnóstico de depressão, a criança e a família devem ser encaminhadas à psicoterapia. O treinamento de pais e parentes para proporcionar um ambiente afetuoso, harmonioso, estimulante, com manejo comportamental equilibrado, brincadeiras e reforço positivo é fundamental para a recuperação clinica e prevenção de recidivas na infância.
“O tratamento por meio de brincadeiras e atividades prazerosas torna o processo de cura mais rápido e efetivo. Pesquisas têm demonstrado resultados positivos com técnicas de meditação e atenção plena. As medicações ansiolíticas e antidepressivas devem ser usadas nos casos de depressão moderada a grave, prescritas por profissional que tenha experiência no manejo das classes de drogas que atuem no Sistema Nervoso Central”, explicam os especialistas.
O Departamento Científico de Desenvolvimento e Comportamento é composto pelos drs. Liubiana Arantes de Araújo; Lívio Francisco da Silva Chaves; Adriana Auzier Loureiro; Ana Márcia Guimarães Alves; Márcio Leyser; Ana Maria Costa da Silva Lopes; João Coriolano Rego Barros; e Ricardo Halpern.
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