O professor emérito da Universidade Federal de Pelotas, dr Cesar Victora, 65 anos, se tornou nesta terça-feira (28) o primeiro brasileiro a receber o prêmio Gairdner de Saúde Pública, um dos mais importantes do mundo. O pesquisador na área da pediatra e epidemiologista teve o trabalho reconhecido pelo impacto na saúde materno-infantil e na nutrição de nações pobres e em desenvolvimento. Graças às pesquisas desenvolvidas por ele, na década de 1980, a Organização Mundial de Saúde (OMS) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) reviram as recomendações sobre aleitamento exclusivo até os seis meses de vida.
Ele integra o grupo de sete cientistas que receberam, este ano, o Prêmio Gairdner. Ganhadores desse título são considerados como potenciais candidatos à indicação para o Prêmio Nobel. Victora recebeu o prêmio na categoria Saúde Global, concedido àqueles que, com suas pesquisas, contribuem de forma positiva para a saúde de países em desenvolvimento.
AMAMENTAÇÃO - Na década de 1980, seu trabalho foi o primeiro a mostrar que a amamentação exclusiva, ou seja, sem oferta de águas ou chás para bebês, ajudava a reduzir a morte dos bebês no primeiro período da vida. De acordo com estudo, o aleitamento exclusivo até seis meses reduz em 14 vezes o risco de morte por diarreia e em 3,6 vezes o risco de morte infantil por doenças respiratórias.
Segundo o médico brasileiro premiado, existem algumas hipóteses que explicam a associação entre a oferta de água e chá aos bebês e o aumento nos casos de morte. “Em primeiro lugar, a mortalidade maior era nas famílias mais pobres, que não tinham acesso a saneamento. A má higienização da água poderia introduzir bactérias e contaminar os bebês. Além disso, o estômago do recém-nascido é muito pequeno, do tamanho de uma colher de sopa. Ao ingerir mais líquido, ele mama menos e deixa de receber todas as substâncias do leite materno que evitam infecções”, disse.
A pesquisa, que mais tarde foi replicada em outros países, alterou totalmente a recomendação da alimentação infantil. A Organização Mundial da Saúde (OMS) passou a indicar que bebês nos primeiros meses de vida se alimentassem exclusivamente com leite materno.
MIL DIAS - A premiação também reconheceu o estudo de coorte de Pelotas, que Victora desenvolve desde 1982. Nesse trabalho, o médico acompanha, desde o nascimento, 6 mil pessoas. Com os resultados da pesquisa, que ainda está em curso, o brasileiro ajudou a estabelecer a influência dos primeiros mil dias de vida (da concepção aos 2 anos de idade) para o desenvolvimento e a saúde do indivíduo ao longo de toda a vida. Entre as descobertas, está a de que a amamentação prolongada na infância aumenta os níveis de inteligência (QI), escolaridade e renda aos 30 anos.
Para a presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), dra Luciana Rodrigues Silva, trata-se de uma conquista histórica para a medicina do País. “Dr César Victora é, sem dúvida, um dos maiores pesquisadores brasileiros, que tem contemplado a comunidade científica com belíssimos trabalhos com foco na atenção à infância. Seu esforço, agora reconhecido, tem sido fundamental para a prevenção de doenças e a melhoria das condições de saúde nos países em desenvolvimento, sobretudo nos campos da amamentação e da nutrição materno-infantil”, ressaltou.
Modesto, o médico se disse surpreso com a premiação. “Fiquei muito satisfeito e surpreso. É um prêmio muito importante na área de saúde global, inclui pessoas que descobriram o ebola, a Aids…”, enumera. Na edição de 2017, também foram premiados Akira Endo, presidente dos Laboratórios Biopharm, pela descoberta e o desenvolvimento das estatinas; o fisiologista da Universidade de San Francisco David Julios, por determinar as bases moleculares da somatosensação (como o corpo percebe calor, frio e dor); Lewis E. Kay, geneticista da Universidade de Toronto pelo desenvolvimento do espectroscópio moderno; Rino Rappuoli, cientista da GSK Vacinas, pela abordagem pioneira usada no desenvolvimento da vacina contra a meningite B; a neurologista do Hospital Infantil do Texas Huda Y. Zoghbi, pela descoberta da base genética da síndrome de Rett, e o neurologista da Universidade de Ottawa Antoine M. Hakim, pela pesquisa de prevenção de derrames.
Diante da repercussão do prêmio e da possibilidade de ver o pesquisador brasileiro integrar o seleto grupo de candidatos ao Nobel, dra. Luciana comemora: “hoje a pediatria brasileira está em festa, compartilhando o merecido prêmio recebido pelo dr. César, que tanto tem feito pela saúde materno-infantil do nosso país”.
*Com informações da Agência Estado e Diários Associados.
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