Carta aberta à população

A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) em conjunto com a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) vêm, por meio desta, declarar que respeita e apoia as decisões do Programa Nacional de Imunizações (PNI) que são pautadas pelas melhores evidências científicas disponíveis em prol da saúde da população pediátrica brasileira.

Fomos recentemente abordados por uma iniciativa do Conselho Federal de Medicina (CFM) de fazer uma pesquisa de opinião junto aos médicos brasileiros sobre a vacinação infantil contra a covid-19. Esta pesquisa está aberta a todos os médicos, com quatro perguntas sem opção de argumentos ou comentários, desprovida de metodologia adequada para os objetivos propostos. É nosso entendimento que uma pesquisa com essas características possibilita interpretações equivocadas, e sem perspectivas de fornecer bases fundamentadas em evidências científicas, não sendo, portanto, um instrumento de utilidade ao Conselho no que diz respeito a posicionamentos e tomadas de decisões. A discussão sobre a obrigatoriedade da vacinação não pode ser alterada com as recomendações e evidências científicas do benefício da vacinação.

Existem evidências claras que apontam os benefícios da vacinação pediátrica na prevenção das formas agudas da doença, reduzindo o risco de hospitalizações, bem como suas complicações em curto e longo prazo na população pediátrica. Estas evidências apontam para a necessidade de que tenhamos vacinas atualizadas e disponíveis para o grupo de crianças menores de 5 anos, onde ainda temos uma proporção significativa de crianças nunca infectadas e sem doses de vacina.

Segundo o último boletim epidemiológico oficial do Ministério da Saúde, hoje, as maiores taxas de incidência de hospitalização por síndrome respiratória aguda grave (SRAG) por covid-19 encontram-se entre os menores de um ano e os maiores de 80 anos de idade. Só em 2023 foram confirmadas 5.006 hospitalizações por SRAG causadas pela covid-19 e 135 mortes por covid-19 em crianças menores de cinco anos de idade, cerca de metade delas entre as crianças anteriormente saudáveis, sem nenhum fator de risco. Muitas dessas hospitalizações e mortes podem ter sido evitadas. É importante ressaltar que segundo os dados oficiais não há óbitos de crianças relacionados com as vacinas covid-19 utilizadas no país .

Somos a favor da prevenção de doenças por meio de vacinas disponíveis no Brasil, desde que tenham aprovação da ANVISA e discussão especializada e aprovada pela Câmara Técnica de Avaliação em Imunização (CTAI).

Todas as vacinas incluídas no PNI e amplamente utilizadas na rotina de vacinação de nossas crianças e adolescentes, pela lei brasileira, têm caráter obrigatório, conforme previsto no estatuto da criança e adolescente (ECA), ou seja, é um direito da criança ser protegida contra doenças evitáveis. Isto serve para vacina da poliomielite, sarampo, meningite entre outras, incluindo a vacina contra a covid19.

Em relação à autonomia dos médicos em prescrever e tomar decisões determinadas por órgãos públicos especializados e competentes em saúde pública, teria algum sentido um médico, por acreditar na sua autonomia, por exemplo, deixar de prescrever tratamento para um paciente com tuberculose ativa? Todas as medidas de saúde pública devem ser seguidas pelos médicos ligados ao CRM e ao CFM.

A covid-19 é uma doença passível de prevenção por vacinas, especialmente na prevenção de suas formas mais graves. Infelizmente, o Brasil registrou taxas de mortalidade e letalidade da covid-19 em crianças muito elevadas quando comparadas às taxas registradas por países da Europa ou da América do Norte, destacando a importância de termos aqui recomendações próprias que podem de alguma forma minimizar o impacto e a cruel iniquidade desta doença, um exemplo do que já vimos com diversas outras doenças infecciosas em crianças.

A incorporação de vacinas pelo SUS é prerrogativa do Ministério da Saúde e do PNI, como sempre, foi baseada em evidências científicas robustas e na avaliação de diversos especialistas, e não tem caráter opinativo. Assim, SBI e SBP, se manifestam contra este tipo de pesquisa pouco útil sugerida pelo CFM e permanecem fiéis a todas as recomendações que visam melhorias na Saúde Pública do nosso país.

Igualmente, nos colocamos à disposição do CFM para que, ouvindo os especialistas nacionais da área, possa atuar de maneira a promover a saúde e o bem-estar das crianças e adolescentes brasileiros.

 

Sociedade Brasileira de Pediatria