No início dos anos de 1980, o médico epidemiologista e presidente de honra do 39º Congresso Brasileiro de Pediatria (CBP), dr. Cesar Victora, de Pelotas (RS), colocou para si o desafio de comprovar a tese de que a amamentação materna exclusiva ministrada aos bebês até os seis meses tinha relação direta com saúde e qualidade de vida, inclusive na vida adulta.
Nesta quarta-feira (9), na conferência de abertura do Congresso, que acontece em Porto Alegre (RS), ele apresentou dados de estudos de coorte realizados em Pelotas entre 1982 e 2015, que confirmam a hipótese que o médico carregava desde os tempos de estudante. Os índices de mortalidade infantil e desnutrição caíram em casos de bebês que não recebiam uma “chuquinha” de água ou chá como complemento ao leite.
No período de estudo, dr. Victora verificou o crescimento da amamentação exclusiva em 45%, o que impactou positivamente os índices de desnutrição. As evidências científicas apresentadas foram as primeiras a demonstrar que a amamentação exclusiva, da concepção até os dois anos de idade, reduz em 14 vezes o risco de morte por diarreia e em 3,6 vezes o risco de morte por doenças respiratórias.
O conceito de amamentação exclusiva rendeu ao dr. Cesar Victora o reconhecimento da Organização Mundial de Saúde (OMS) e da Unicef, que passaram a recomendar a prática em nível mundial. Além disso, ele recebeu o Prêmio Gairdner, na categoria Saúde Global, em função da contribuição positiva de seu trabalho para os países em desenvolvimento. Dr. Victora encerrou a conferência afirmando que, com base em seus estudos, a amamentação exclusiva projeta condições adequadas de saúde, nutrição e desenvolvimento neuropsicomotor na vida adulta.
Esse foi o primeiro estudo mundial a mostrar a importância do aleitamento exclusivo. “Isso foi uma importante descoberta para evitar as mortes de bebês no mundo, principalmente por diarreia, muito comuns à época. Diversas pesquisas, incluindo a desenvolvida por nós, mostram que o aleitamento materno mais extenso e duradouro ajuda no desenvolvimento da inteligência da criança (QI) e na prevenção da obesidade na infância e na vida adulta”, comenta o dr. César.
Victora diz que o aleitamento materno passou a ser respaldado por uma série de evidências científicas que só podem ser obtidas por meio de estudos de longa duração, como o estudo das cortes de Pelotas. “Ficamos satisfeitos em ver a nossa pesquisa reconhecida e por saber que os resultados obtidos em Pelotas têm conseguido mudar as políticas globais de alimentação infantil”, comemora o médico.
Para a presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), dra. Luciana Rodrigues Silva, trata-se de um avanço histórico para a medicina do País. “O dr. César Victora é, sem dúvida, um dos maiores pesquisadores brasileiros, que tem contemplado a comunidade científica com belíssimos trabalhos voltados para a atenção à infância. Seu esforço, agora reconhecido internacionalmente, tem sido fundamental para a prevenção de doenças e a melhoria das condições de saúde nos países em desenvolvimento, sobretudo nos campos da amamentação e da nutrição materno-infantil”, ressaltou a presidente.
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