Dedicação e paixão pela ciência marcam trajetória de pediatra premiada, no Estado de São Paulo

Entender o fenômeno do desenvolvimento do sistema imunológico foi o que despertou jovem Magda Carneiro Sampaio o interesse em ser pediatra. Hoje ela é médica especialista em doenças raras, com trabalho reconhecido internacionalmente, inclusive por ser uma das pioneiras na área das manifestações autoimunes nas Imunodeficiências Primárias (IDPs), o que, segundo conta, é “um verdadeiro …

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Entender o fenômeno do desenvolvimento do sistema imunológico foi o que despertou jovem Magda Carneiro Sampaio o interesse em ser pediatra. Hoje ela é médica especialista em doenças raras, com trabalho reconhecido internacionalmente, inclusive por ser uma das pioneiras na área das manifestações autoimunes nas Imunodeficiências Primárias (IDPs), o que, segundo conta, é “um verdadeiro paradoxo que cada vez mais desperta o interesse dos imunologistas”.

Na última quarta-feira (29), seu trabalho no campo da prevenção às situações de vulnerabilidade entre crianças e adolescentes rendeu-lhe o Prêmio Excelência Mulher 2017, considerado como uma das mais importantes homenagens à mulher no Estado de São Paulo. 

Formada pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e com doutorado pela Universidade de São Paulo (USP), dra. Magda atua em Imunologia aplicada à Pediatria com foco em temas como imunodeficiências primárias, autoimunidade, imunologia do leite humano. Desde 2009, é presidente do Conselho Diretor do Instituo da Criança do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.

Em entrevista ao SBP Notícias, Dra. Magda Sampaio conta a sua trajetória profissional e do trabalho incansável em prol das crianças e adolescentes com doenças raras.

SBP NOTÍCIAS – O que a levou a escolher a Pediatria?

Dra. Maga Sampaio – Foi o interesse em entender o fenômeno do desenvolvimento. Desde o sexto ano de Medicina, meu tema principal tem sido entender o desenvolvimento do sistema imunológico e as consequências de sua imaturidade para a saúde da criança em cada faixa etária.

SBPN – A senhora poderia nos contar um pouco mais sobre sua trajetória?  

MS - Graduei-me na Universidade Federal de Pernambuco, em 1973, e, com isso, fiz o internato obrigatório e o opcional no Instituto de Medicina Infantil de Pernambuco (IMIP). Em seguida, fiz residência no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), sendo dois anos de Pediatria Geral e um ano de Alergia e Imunopatologia, esta última na Clínica Médica, em razão de não existir essa área na Pediatria. No R3, fui admitida no Doutorado, tendo minha tese versada sobre a “Imunidade Mediada por Linfócitos T na Asma Brônquica”, sob a orientação do professor Charles Naspitz, docente da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM-UNIFESP), e que generosamente se credenciou na FMUSP para me orientar, no ano de 1978. Fiz um pós-doc sobre Imunologia das Doenças Infecciosas, em 1983, em um laboratório da World Health Organization (WHO), em Lausanne, na Suíça, com parte do aprendizado adquirido na Suécia, no Departamento de Pediatria da Universidade de Gothemburg, sob a orientação do professor  Lars Hanson, que me despertou o interesse pela Imunologia do Leite Humano, pois ele foi um dos autores que descreveu a IgA das secreções externas. 

SBPN –  Qual o papel dos pacientes e seus familiares nesta jornada?

MS - Passei 15 anos de minha carreira (1989-2004) trabalhando no Instituto de Ciências Biomédicas da USP, onde, graças à generosidade das mães internadas no Hospital Universitário da USP, pude me dedicar, sobretudo, ao estudo da Imunologia do Leite Humano e da Passagem Transplacentária de Anticorpos. Esse período foi o mais rico da minha carreira, sob o ponto de vista científico. Lá, interagi com um dos maiores mestres que tive: o microbiologista Luiz Rachid Trabulsi. Em 2005, voltei ao Instituto da Criança (ICr) como professora titular do Departamento de Pediatria da FMUSP e nos últimos oito anos assumi a presidência do Conselho Diretor do ICr, onde tenho dedicado parte significativa do meu tempo à chamada humanização do atendimento, no caso, no âmbito da atenção terciária à criança e ao adolescente. Felizmente, estamos atravessando essa grave crise econômica sem ter reduzido nem os números e nem a qualidade do atendimento, tampouco foram prejudicados o ensino, a pesquisa e a inovação e isso me traz muito conforto. 

Para a senhora, qual foi a sua maior conquista?

Penso que minha contribuição mais original no Brasil foi o estudo das Imunodeficiências Primárias (IDPs) desde o final dos anos 70 do século passado. As IDPs representam hoje um grupo de doenças genéticas consideradas das menos raras e mais esclarecedoras para se entender como o sistema imunológico humano funciona. No âmbito internacional, orgulho-me de ser uma das pioneiras na área das manifestações autoimunes nas IDPs, um verdadeiro paradoxo que cada vez mais desperta o interesse dos imunologistas.

SBPN – O que considera como seu maior desafio nesses anos de atuação?

MS - Cada época teve seu desafio ao longo dos quase 40 anos de carreira independente, desde que terminei o Doutorado, em 1978. Hoje, o meu grande desafio é fazer as autoridades/planejadores de saúde reconhecerem a relevância das chamadas doenças raras, quase todas de origem genética, entre as quais as IDPs representam um dos grupos mais frequentes na população. Esse tema tem me aberto para uma experiência nova representada pela interação com as associações de pacientes e familiares e aqui minha cooperação tem sido, sobretudo, com a “Raríssimas”, de Portugal, e agora também do Brasil.

“A Pediatria é uma área fantástica e extremamente versátil na sua atuação. Temos desde o valioso pediatra geral aos especialistas em várias áreas de atuação, que têm na pediatria um campo extremamente vasto e cheio de questões a serem respondidas”.

SBPN – Como vê o reconhecimento do seu trabalho com o Prêmio Excelência Mulher?

MS - Devo compartilhar essa honraria com todo o corpo clínico e de funcionários do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da FMUSP, com quem venho trabalhando para a melhor qualidade do atendimento à criança e ao adolescente com doenças graves, complexas e de difícil elucidação diagnóstica. Aqui, destaco o projeto que fizemos em conjunto denominado “Diagnóstico Amigo da Criança”, que tem como objetivos principais reduzir o volume de sangue colhido para análises laboratoriais; reduzir a exposição da criança aos raios-X, com o intuito maior de resgatar a importância dos dados clínicos da anamnese e dos exames físicos, hoje tão subestimados em face aos antigamente chamados exames complementares.

SBPN – Qual mensagem deixa aos jovens que querem seguir na Pediatria?

MS - A Pediatria é uma área fantástica e extremamente versátil na sua atuação. Temos desde aquele valioso pediatra geral, que acompanha a criança ao longo de seu desenvolvimento, com um papel primordial de educador da família e de crítico para a saúde do paciente ao longo de todo o ciclo de vida, até os neonatologistas, intensivistas, especialistas em várias áreas, sanitaristas, para não falar de pesquisadores, que têm na Pediatria um campo extremamente vasto e cheio de questões a serem respondidas. E todos nós, no fundo, somos educadores, sejamos ou não formalmente docentes!