As dificuldades para conseguir um diagnóstico e a carência de políticas públicas voltadas às chamadas doenças raras ainda são grandes desafios para o Brasil. O alerta é do dr. Salmo Raskin, membro do Departamento Científico de Genética da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), que no Dia Mundial das Doenças Raras, celebrado nesta quinta-feira (28), destacou a importância desse grupo composto por mais de 8 mil patologias consideradas incomuns pela medicina, mas que afeta milhões de pessoas em todo o mundo.
Segundo o especialista, estimativas indicam que entre 6% e 8% da população brasileiras sofram com algum tipo de doença rara. "Só um subgrupo dessas doenças raras, as anomalias congênitas, atinge aproximadamente 4% de todos os nascidos vivos e segue como a segunda maior causa de mortalidade infantil no Brasil há mais de 30 anos. Mesmo assim, até hoje não temos uma política pública em funcionamento que proporcione atendimento adequado aos pacientes”, criticou.
ENTRAVES – Em janeiro de 2014, o Ministério da Saúde estabeleceu a Portaria nº 199, que institui a Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doenças Raras. Entre as medidas elencadas, constam diretrizes para atenção integral dos pacientes por meio do Sistema Único de Saúde (SUS) e a constituição de incentivos financeiros de custeio. No entanto, após mais de cinco anos desde a publicação, poucos avanços efetivos ocorreram no processo de implementação.
“Atualmente, muitos dos pacientes com doença rara vivem por anos em condições precárias e sem a atenção de saúde adequada. Até mesmo quando existem medicamentos específicos, o acesso ao tratamento acontece apenas por meio da judicialização. Isto é, quando se consegue um diagnóstico, pois na grande maioria dos casos os pacientes passam de um especialista a outro sem chegar a uma resposta”, destaca o dr. Raskin.
Devido às peculiaridades existentes no contexto das doenças raras – cerca de 80% delas têm causas genéticas –, é imprescindível estabelecer medidas específicas para garantir uma resposta eficiente do Estado à população. Entre as ações necessárias, avalia o especialista, está a criação de centros de referência ao menos em todas as capitais do País, para garantir o acesso à atenção de saúde especializada e multiprofissional.
De acordo com o representante da SBP, são poucos os municípios que contam com médicos geneticistas capacitados no atendimento em doenças raras. Em menos de 1% das cidades existem profissionais atualizados no assunto e, consequentemente, não há tratamento disponível. Para reverter esse panorama, outra medida fundamental é a inclusão do tema como disciplina obrigatória nos cursos de Medicina.
“É uma questão de educação médica. No geral, o currículo é voltado apenas para o atendimento de doenças frequentes. Num curso de seis anos, deveria haver também uma disciplina sobre doenças raras. Apesar de serem individualmente raras, no somatório, afetam uma parcela significativa da população”, esclarece.
PEDIATRIA – A maior parte dessas patologias se manifesta ainda na infância. O pediatra tem papel fundamental nesse espectro, pois quando ele está habilitado a reconhecer precocemente a patologia, pode encaminhar o paciente a um especialista em genética. Quanto mais cedo for iniciado o tratamento, melhores serão os resultados na qualidade e expectativa de vida.
Para o dr. Salmo Raskin, nos últimos anos aconteceram enormes avanços na capacidade de diagnóstico e tratamento de doenças raras, mas o progresso não tem serventia se não for acessível a população afetada. O especialista enfatiza que negar o acesso a um medicamento pode fazer a diferença entre a vida e a morte.
“O baixo índice de incidência das doenças raras na população não pode servir como justificativa para que os pacientes deixem de receber os cuidados necessários. Além disso, quando não há políticas eficientes, o Estado também perde. A atual tendência de judicialização dos casos acaba onerando muito mais os cofres públicos do que se houvesse um acordo com as indústrias e um plano de ação consolidado”, conclui.
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