Cerca de 42 mil adolescentes brasileiros serão assassinados nos municípios com mais de 100 mil habitantes até o ano de 2019. A estimativa alarmante é do Laboratório de Violência (LAV-UERJ) baseada em dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade do Ministério da Saúde e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), coletados no período de 2010 e 2012, e publicados no relatório Índice de Homicídios na Adolescência (IHA) do Programa de Redução da Violência Letal no Brasil.
O cálculo foi baseado no emprego de tábuas de vida e a aplicação de taxas de homicídios específicas para as coortes de 12, 13, 14, 15, 16, 17 e 18 anos, multiplicando a população de 12 a 18 anos de cada localidade pelo risco ao longo do período. “Trata-se apenas de uma estimativa, pois o valor concreto depende de vários pressupostos sobre a distribuição demográfica entre essas faixas etárias, o seria excessivamente complicado calcular para cada localidade. Infelizmente, a primeira previsão que fizemos anos atrás (2012) acabou ficando perto do valor real com o passar dos anos”, explica o professor Ignácio Cano, doutor em Sociologia e professor-adjunto da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), que apresentou os dados e as conclusões.
POLÍTICAS PÚBLICAS - Este tema foi discutido durante o 18º Fórum da Academia Brasileira de Pediatria (ABP), realizado no Rio de Janeiro, em setembro. Pela gravidade do problema e profundidade das apresentações, a mesa-redonda “Morte violenta na criança e no adolescente” – coordenada pela dra. Conceição Aparecida de Mattos Segre, assessora de campanhas da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e relatada pela dra. Leda Amar de Aquino, membro da Comissão Local – foi um dos destaques da programação.
“É fundamental investir em educação, pois essa é a única maneira de prevenir esses desvios de comportamento da sociedade. Além disso, é preciso divulgar e promover debates sobre o assunto com os profissionais de saúde e as autoridades locais, como a SBP e a ABP vêm fazendo ao inserir o tema na programação do fórum”, conclui a dra. Conceição Segre.
A presidente e o 1º vice-presidente da SBP, dra. Luciana Rodrigues Silva e o dr. Edson Liberal, concordam com a importância de se discutir políticas públicas que contemplem os problemas que afetam a infância e a adolescência dos brasileiros, inclusive, ouvindo as contribuições dos pediatras, por meio de suas entidades de representação. O diagnóstico, cuja apresentação foi acompanhada por ambos no 18º Fórum, ajuda a entender as dimensões e impactos relacionados a este problema. Ambos consideraram as informações úteis e estratégicas para o desenvolvimento de ações que ajudem na prevenção à violência, em especial junto aos membros dessa faixa etária
QUADRO NACIONAL – Pelo trabalho apresentado, o Nordeste tem a situação mais grave. De acordo com a IHA, na região deve ocorrer, até 2019, um total de 16.180 mortes de adolescentes com idades de 12 a 18 anos. Em segundo lugar vem a Região Sudeste (14.323), seguida das Regiões Norte (3.908), Sul (3.854) e Centro-Oeste (3.575). Dentre as Unidades de Federação, o quadro mais grave é em Alagoas, com índice de 8,82 mortes para cada grupo de mil adolescentes.
O Rio de Janeiro ocupa a 17ª colocação (2,71 mortes) e São Paulo aparece em 25º lugar, com 1,29 mortes para essa faixa etária. Entre as capitais, o IHA mostra que Fortaleza (CE) possui o maior índice, com 9,9 mortes para adolescentes entre 12 e 18 anos. A cidade do Rio de Janeiro ocupa a 21ª posição, com 2,1 mortes, e São Paulo em 23ª colocada, com 1,7 mortes. A situação deixa o País numa posição ruim em comparação com outros.
De acordo com o “Mapa da Violência 2015 – Mortes Matadas por Armas de Fogo”, o Brasil ocupa a 11ª posição no ranking entre 90 nações analisadas, ficando apenas atrás de países como a Venezuela, El Salvador, Trinidad e Tobago e Iraque, que são proporcionalmente mais violentos. A proporção nacional para os municípios com mais de 100 mil habitantes é de 3,32 mortes para cada mil adolescentes que completam os 12 anos.
RISCOS RELATIVOS – A correlação entre o IHA 2012 e os riscos relativos foi realizada com base nas taxas de homicídios para a população com idade entre 12 e 18 anos nos municípios com mais de 100 mil habitantes. Considerando dados de 288 municípios, que, em 2012, apresentavam população de mais de 100 mil habitantes, neste segmento, para cada grupo de 1000 adolescentes de 12 anos, 3,32 perderão a vida vítimas de homicídio antes de completar os 19 anos.
Ao analisar a população desses mesmos municípios, conclui-se que o risco para um adolescente do sexo masculino se tornar vítima de homicídio é 11,92 maior do que um adolescente do sexo feminino. Quanto à etnia/cor das vítimas, a chance de um adolescente negro ser assassinados é 2,96 maior em relação a um adolescente branco.
A partir da análise desses e outros fatores, em síntese, o risco relativo para o conjunto dos 288 municípios estudados é de 4,67. Ou seja, a possibilidade de um adolescente ser vítima de homicídio por arma de fogo é quase cinco vezes maior do que por outros meios. Para os especialistas no tema, essa situação confirma o papel central das armas de fogo na violência letal contra os adolescentes e a importância de políticas públicas de controle de armas.
“As armas de fogo são as maiores responsáveis pelas mortes letais no Brasil e os homens são as maiores vítimas, principalmente os negros e residentes de periferias. É preciso pensar em ações de políticas públicas para modificar essa realidade prevalente há tempos no País”, diz Ignácio Cano (foto).
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