Dentre os adolescentes de 11 a 17 anos, 15% relatam que foram vítimas de ofensas ou chantagens pela internet. Na mesma faixa etária, 21% tiveram contato com mensagens de ódio contra pessoas ou grupo de pessoas. Estas são duas das constatações de pesquisa TIC Kids Online Brasil-2014, realizada pelo Comitê Gestor da Internet (CGI), que faz o retrato mais atualizado dos contornos do cyberbullying e de outros riscos à saúde de crianças e adolescentes na era digital.
Quando se avalia a exposição a mensagens de ódio, percebe-se que o grupo de 15 a 17 está mais exposto: 27% dos que o integram declaram haver tido contato com textos de conteúdo ofensivo. Logo após, vêm os segmentos de 13 a 14 anos (21%) e de 11 a 12 anos (20%). Na avaliação sobre o abuso por conta de tratamento ofensivo, nota-se que também os mais velhos foram os que mais tiveram que lidar com esse problema (20%). Ao mensurar a percepção de uso de informações pessoais de forma inadequada, o grupo de 11 a 12 anos foi o que alegou sofrer mais com o constrangimento (12%).
PROBLEMAS FÍSICOS - Além dessas consequências negativas do cyberbullying ou outras violências, como a criação de redes de ódio e o aumento da intolerância que se propagam no mundo virtual, caracterizando uma síndrome de dependência ou de uso problemático e interativo das mídias durante a infância e adolescência, ainda se percebe que o uso inadequado ou abusivo destas ferramentas pode gerar uma série de dificuldades físicas e mentais para os jovens e suas famílias.
Entre os sintomas possíveis, estão problemas de sono, sedentarismo, problemas posturais, queda no rendimento escolar, transtornos de comportamento e mentais (devido ao tecnoestresse). De forma complementar, a adoção de headphones nas sessões de internet também pode afetar audição, assim como ficar por um período prolongado diante de um monitor de vídeo pode causar a síndrome do olho seco, também conhecida como Computer Vision Syndrome, a qual compromete a visão.
Diante dessa situação, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) decidiu fazer a capacitação dos médicos para que atuem de forma preventiva para reduzir os transtornos causados por este fenômeno. Cursos e treinamentos deverão ser oferecidos pela entidade, assim como textos de referência na abordagem juntos aos adolescentes e seus pais.
ESPAÇO ABERTO - “Trata-se de um espaço carente da inserção de profissionais capacitados e habilitados. Os pediatras têm plenas condições de atuarem junto às escolas e às famílias no preenchimento dessa lacuna, sempre em prol da saúde e do bem-estar, individual e coletivo”, disse a presidente da SBP, dra Luciana Rodrigues Silva.
O problema do cyberbullying e suas consequência foi tema da sessão de videoconferência organizada pelo Grupo de Especial Interesse em Saúde de Crianças e Adolescentes da Rede Universitária de Telemedicina (RUTE), em 25 de agosto. A atividade foi coordenada pela dra Evelyn Eisenstein, Professora Associada da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (FCM-UERJ). “O SIG-RUTE no seu décimo ano de trabalho e completando sua 90ª sessão de videoconferência nacional começa, assim, mais uma nova fase de disseminação de conhecimentos através da parceria com a SBP e já com rede estabelecida entre três Estados – Rio de Janeiro, Bahia e Ceará – e brevemente chegando a outros locais”, disse dra Evelyn.
Juntos, pediatras de oito estados deram o passo inicial em direção a uma parceria entre as redes de profissionais da área, que compõem a RUTE e SBP e demais regionais, no sentido de fortalecer esforços com os cuidados específicos de crianças e adolescentes brasileiros, com foco no uso inapropriado da internet. Entre os participantes da videoconferência, estavam: a presidente da SBP, que também é professora da Universidade Federal da Bahia (UFBA); a dra Isabel Rey Madeira, presidente da Sociedade de Pediatria do Estado do Rio de Janeiro (SOPERJ); a dra Suzy Santana Cavalcante, da UFBA; o dr João Amaral, Universidade Federal do Ceará (UFC); e o Dr Luiz Ary Messina, coordenador Nacional da RUTE.
PERFIL DE USO - Dados da pesquisa TIC Kids Online Brasil-2014 e referências de segurança da rede SAFERNET e dicas saudáveis para os pais e famílias foram apresentados durante a videoconferência, estimulando o debate sobre como orientar e atualizar os pediatras sobre os cuidados de saúde das crianças e adolescentes com respeito a esta questão.
De acordo com a TIC Kids 2014, na faixa de 10 a 17 anos, há 20,5 milhões de usuários da internet, ou seja, 77% da população que compõe este segmento. Os percentuais de utilização são mais altos no Sul (87%), Sudeste (86%) e Centro-Oeste (81%). O grau de acesso à rede mundial de computadores é muito alto: 81% dos entrevistados declaram que a usam todos os dias. O percentual é quase o dobro da pesquisa realizada em 2012.
O celular é a forma mais empregada para visitar sites e redes sociais, mostra o estudo. Em 2014, 82% dos adolescentes usam seus aparelhos móveis, como smartphones. Em 2012, estes aparelhos representavam 53%. No período, também cresceu muito o volume de acessos via tablet (de 16% para 32%) e caiu o de utilização de computadores de mesa (desktops), que passaram de 71% para 56%.
Na avaliação da dra Evelyn Eisenstein, o acesso ao mundo digital traz benefícios, como a possibilidade de interação profissional e o compartilhamento de informações e saberes, e também riscos, quando acontece sem regras ou limites éticos quanto à privacidade e segurança das mensagens trocadas ou ao tempo de utilização. Para ela, a idade de início e o tempo de exposição das crianças e adolescentes que ficam “plugados” ou conectados no mundo virtual podem trazer prejuízos à saúde. Isso ocorre no uso de jogos eletrônicos, redes sociais ou troca de mensagens em lugar da interação no “mundo real”.
VÍCIO – A situação apontada pela dra Evelyn não é exclusividade do Brasil. Artigo publicado em 27 de agosto, no jornal New York Post aborda o tema sob a perspectiva dos Estados Unidos. O texto, assinado pela dra Kimberly Young, descreve o comportamento de crianças que iniciam a “vida digital” muito cedo e analise a forma como os jogos online e o uso constante de notebooks e videogamers agem como se fosse uma “cocaína digital”.
A exposição constante, afirma a autora, o córtex frontal que controla o funcionamento executivo e o controle dos impulsos, aumentando os níveis de dopamina circulantes. Entre os problemas que causam, estão o aparecimento de transtornos de sono, depressão, ansiedade e agressividade. Em alguns casos, pode-se chegar a surtos psicóticos com a dissociação entre o real e o virtual (transe).
O problema acontece, em especial, em filhos de pais “distraídos” (Distracted Parent Syndrome), que se sentem sozinhos, alienados, chateados. Em situações, assim, dra Kimberly sugere que se estimule a troca de jogos online por livros e atividades esportivas e se busque levar às crianças a ter maior contato com a Natureza, conectando-se com as experiências “reais” e significativas da vida familiar, e refeições em família, com criatividade e afeto.
Para ler o texto, em sua versão original, acesse: http://nypost.com/2016/08/27/its-digital-heroin-how-screens-turn-kids-into-psychotic-junkies/
Para mais informações, acessar:
www.sbp.com.br
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