Dioclécio Campos Júnior
Médico, professor titular da UnB e presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria
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O Brasil emerge no terceiro milênio como nação moderna a gozar de progressivo respeito internacional. As autenticidades do povo novo que a constitui surpreendem instituições mundiais e deslumbram lideranças mais jovens do planeta.
A sociedade brasileira está, porém, eivada de iniquidades geradas pela selvageria colonial de origem. São os estigmas sociais que perduram, as injustiças que maculam a cidadania. Não há como ocultá-los. Contudo, o amadurecimento político é visível e projeta perspectivas de transformações capazes de recuperar o tempo perdido.
A extensão da licença-maternidade para seis meses é a maior prova de que os tempos são outros. Resultou de projeto elaborado pela Sociedade Brasileira de Pediatria em parceria com a senadora Patrícia Saboya e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Foi amplamente debatido no país durante três anos, até ser aprovado pelo Congresso Nacional e sancionado pelo presidente Lula. Opinião pública, órgãos governamentais, lideranças diversas, expoentes empresariais e meios de comunicação animaram discussões de elevado nível para vencer resistências. Os direitos da criança e da mãe vieram à tona com o poder de persuasão que possuem. Ficou demonstrado o caráter decisivo dos seis primeiros meses de vida para o crescimento e a diferenciação do cérebro do ser humano, logo, para a gênese do futuro cidadão. As autoridades, convictas do acerto da medida, não hesitaram. A lei entrou em vigor. Criou a categoria de empresa-cidadã para aquela que conceder dois meses suplementares de licença-maternidade às suas trabalhadoras. Como contrapartida, assegura-lhe a isenção fiscal correspondente.
A implantação da conquista, que não é impositiva, faz-se rapidamente. Obedece ao ritmo do despertar de consciência que deve presidir os avanços verdadeiros da humanidade. Assim, no setor público, a licença de seis meses concretizou-se para todas as funcionárias da União, as de 24 estados e as de cerca de 150 municípios. No setor privado, dezenas de empresas adotaram a mudança antes mesmo da aprovação do projeto de lei. Diante do incentivo fiscal, já regulamentado pelo governo em janeiro de 2010, os empresários cumprirão seu papel com firmeza.
O Sindicato dos Bancários, em recente acordo coletivo com os banqueiros, celebra a adesão de todos os bancos do país, públicos e privados, à nobre causa. A vitória consolida-se, a sensibilidade da alma nacional jorra compromissos irreversíveis. O valor da maternidade ganha o reconhecimento a que faz jus. Todas as empresas — micro, pequenas, médias e grandes — hão de ser cidadãs. É mera questão de tempo. Não mais de custo financeiro. Nem da superação de preconceitos.
Mas a progressão da infância prolonga-se além do sexto mês de vida. O cérebro continua a crescer, embora mais lentamente, até o sexto ano. A estimulação que requer não pode ser interrompida. Os seis primeiros anos destinam-se à adaptação cognitiva adquirida de forma original, contínua, livre de condicionamentos, com o afeto e a ternura que temperam o ciclo mais fascinante da existência humana. É quando viver significa brincar em segurança, com a criatividade liberta. É a primeira infância, o mundo pueril, a fase da imaginação que navega na magia de um universo singular, sem obrigações cotidianas, na pura beleza do gesto que não é cênico, nem cínico, apenas autêntico.
Toda criança tem direito de ser infantil para ser feliz. Pelo menos nos seis primeiros anos de vida. Não é miniatura de adulto. Não pode ser privada da puerilidade encantadora, o jardim natural em que floresce sua personalidade. Nem iludida pela futilidade do consumismo compensatório. Merece ambiente de estimulação saudável, o cenário que a maioria dos lares de hoje já não lhe propicia. Creches e pré-escolas de qualidade são a única alternativa possível para a preservação de algum recanto pueril no mundo moderno. Cumpre implantá-las sem mais delongas.
Novo projeto de lei da Sociedade Brasileira de Pediatria, também em parceria com a senadora Patrícia Saboya, cria o Programa Nacional de Educação Infantil para a rápida expansão dessa alternativa. É a forma de dar a todas as crianças a puerilidade plena que lhes cabe por direito. A proposta tramita no Congresso. O governo poderia encampá-la para acabar de vez com a triste realidade de crianças deixadas sozinhas em casa, sob cuidados de babás sem preparo, ou abandonadas à própria sorte. Já apoiou a licença-maternidade de seis meses para a mulher trabalhadora. Agora é a vez do projeto que significa a licença-puerilidade de seis anos para a criança.
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