STF julga nesta quarta (22) se o SUS deve pagar por medicamentos para tratamento de doenças raras

O Superior Tribunal Federal (STF) votará, nesta quarta-feira (22), se os medicamentos de alto custo para o tratamento de doenças raras serão disponibilizados no Sistema Único de Saúde (SUS), mesmo aqueles que ainda não constavam na lista. O processo começou em 2016, mas foi adiado em virtude do pedido de vistas do ex-ministro, Teori Zavasck. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), são mais de 40 mil ações que aguardam posição definitiva da Justiça brasileira sobre o tema.

Na pauta estão os processos que tratam da responsabilidade solidária dos entes federados na prestação dos serviços de saúde (RE 855178), além da obrigação do Estado de fornecer medicamentos considerados de alto custo (RE 566471) e não registrados na Anvisa (RE 657718).

O dr. Salmo Raskin, do Departamento Científico de Genética da Sociedade Brasileira de (SBP), defende que o governo brasileiro se organize para fornecer esses medicamentos aos pacientes que têm indicação. “Esses remédios são extremamente caros e os pacientes terão que usar durante a vida toda. Não há como eles arcarem com esses custos. Por isso, é muito importante que o governo os forneça àqueles que precisam e têm indicação para seu uso. O direito à saúde é uma das garantias da nossa constituição”, argumenta.

O pediatra adverte ainda que, atualmente, os pacientes que precisam desses medicamentos acabam entrando na justiça para consegui-los e, na maioria das vezes, o resultado é favorável. Contudo, isso gera um ônus muito maior para o governo e é extremamente burocrático para os pacientes.

“O governo não possui uma política de atendimento às pessoas com doenças raras e, assim, negligencia o atendimento a elas. Atualmente, já existem medicamentos disponíveis no SUS para quem tem atrofia muscular espinhal, doença de Gaucher e osteogênese imperfeita”, destaca o dr. Salmo Raskin.

CARÊNCIA – As doenças raras são um grupo composto por mais de 8 mil patologias consideradas incomuns pela medicina, mas que afeta milhões de pessoas em todo o mundo. Estimativas indicam que entre 6% e 8% da população brasileira sofra com algum tipo de doença rara.

"Só um subgrupo dessas doenças raras, as anomalias congênitas, atinge aproximadamente 4% de todos os nascidos vivos e segue como a segunda maior causa de mortalidade infantil no Brasil há mais de 30 anos. Mesmo assim, até hoje não temos uma política pública em funcionamento que proporcione atendimento adequado aos pacientes”, critica o pediatra.

IMBRÓGLIO – Em janeiro de 2014, o Ministério da Saúde estabeleceu a Portaria nº 199, que institui a Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doenças Raras. Entre as medidas elencadas, constam diretrizes para atenção integral dos pacientes por meio do SUS e a constituição de incentivos financeiros de custeio.

No entanto, de acordo com o dr. Raskin, após mais de cinco anos desde a publicação, poucos avanços efetivos ocorreram no processo de implementação. “Atualmente, muitos dos pacientes com doença rara vivem por anos em condições precárias e sem a atenção de saúde adequada”, enfatiza.

Devido às peculiaridades existentes no contexto das doenças raras – cerca de 80% delas têm causas genéticas –, é imprescindível estabelecer medidas específicas para garantir uma resposta eficiente do Estado à população. Entre as ações necessárias, avalia o especialista, está a criação de centros de referência em todas as capitais do País, para garantir o acesso à atenção de saúde especializada e multiprofissional.

De acordo com o representante da SBP, são poucos os municípios que contam com médicos geneticistas capacitados no atendimento em doenças raras. Em menos de 1% das cidades existem profissionais atualizados no assunto e, consequentemente, não há tratamento disponível. Para reverter esse panorama, outra medida fundamental é a inclusão do tema como disciplina obrigatória nos cursos de Medicina.

DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO – A maior parte dessas patologias se manifesta ainda na infância. O pediatra tem papel fundamental neste contexto, pois quando ele está habilitado a reconhecer precocemente a patologia, pode encaminhar o paciente a um especialista em genética. Quanto mais cedo for iniciado o tratamento, melhores serão os resultados na qualidade e expectativa de vida.

Para o dr. Salmo Raskin, nos últimos anos aconteceram enormes avanços na capacidade de diagnóstico e tratamento de doenças raras, mas o progresso não tem serventia se não for acessível à população afetada. O especialista enfatiza que negar o acesso a um medicamento pode fazer a diferença entre a vida e a morte.

“O baixo índice de incidência das doenças raras na população não pode servir como justificativa para que os pacientes deixem de receber os cuidados necessários. Além disso, quando não há políticas eficientes, o Estado também perde. A atual tendência de judicialização dos casos acaba onerando muito mais os cofres públicos do que se houvesse um acordo com as indústrias e um plano de ação consolidado”, conclui.

*Com informações do Jornal O Estado de São Paulo.