Às vésperas do “Dia Nacional de Luta Contra o Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes”, a SBP lembra que “Violência é covardia” e “as marcas ficam na sociedade”. “No consultório, assim como no serviço público, nós podemos fazer muito. Tudo começa com a escuta empática e o olhar atento”, diz a dra. Rachel Niskier Sanchez, coordenadora de campanhas e representante da SBP no Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda).
- É importante saber que maus-tratos não são agravo de pobre – enfatiza a dra. Rachel. Aconteceu, por exemplo, com uma família de classe média alta. A menina tinha três anos e oito meses, os pais se separaram quando ainda era lactente. O pai a via nos finais de semana e começou a voltar para a casa da mãe arredia, chorosa, não deixava limpar a genitália direito. A mãe pensou que fosse alienação parental, que é quando um joga o filho contra o outro. Mas um dia viu uma vermelhidão da vulvinha e levou ao hospital. Tinha uma equimose. Quando a pediatra vestiu as luvas, a menina disse: “É assim que o papai faz para mexer aí”. O criminoso ainda vestia a luva…
Ao mesmo tempo, dra. Rachel conta que já testemunhou um caso de um menino, que apareceu no consultório cheio de Condiloma, doença de transmissão sexual também. O avô foi denunciado. Todos na família choravam, juravam que não tinha acontecido. Depois se viu que, de fato, ele não tinha sido abusado, a mãe tinha um Condiloma por problemas conjugais e o HPV pode ser transmitido por roupa contaminada, objetos:
– O importante é o cuidado com a história. Nas classes mais favorecidas, por exemplo, as pessoas tendem a camuflar os sinais da criança, não explicitar o que está ocorrendo, até como forma de diminuir a culpa. Aí começa a grande observação. O pediatra atento já coloca, por exemplo, três cadeiras em frente da sua mesa e observa quem senta aonde. Se a mãe deixa uma para a criança já é um sinal. Tem também o jeito, o tom da voz. Já aconteceu de ser dito que o dia a dia em casa é super harmonioso e assim que a criança começou a falar, teve um grito de “cala a boca, fica quieto”. Dr. Luiz Torres Barbosa dizia que 80% do diagnóstico na pediatria é feito pela observação. Os outros 20% são divididos entre os exames físico e complementares.
Há também aqueles casos em que existe a interface com a violência estrutural e é preciso diferenciar o que é negligência do que é falta de estrutura e apoio socioeconômico, a violência que deriva da falta de uma política pública, de uma escola em tempo integral, de equipamentos esportivos, de lazer, cultura. Outra questão relevante é que quando há um caso de violência, toda a família precisa de atenção e cuidado:
– A família é um sistema. Fazendo um paralelo com a máquina, se uma peça está ruim, o todo não funciona bem. Em geral, estão presentes fatores como desemprego, falta de recursos materiais, alcoolismo e outras drogas, isolamento social, estresse, desamor, perda de parentes. Todas as situações que podem provocar algum tipo de desavença podem também desencadear um cenário de violência. São fatores intrínsecos e extrínsecos interagindo. Não é algo isolado.
Dra. Rachel oferece como sugestão a experiência do Núcleo de Apoio ao Profissional (NAP) do Instituto Fernandes Figueira, no Rio de Janeiro. Semanalmente, sempre no mesmo horário e durante uma hora, os profissionais que lidam com crianças e adolescentes se reúnem no hospital. São pediatras, nutricionistas, ginecologistas, fonoaudiólogos, assistentes sociais, enfermeiras que se encontram para refletir, discutir as condutas.
– Se o pediatra trabalha em consultório, deve frequentar a SBP, participar dos eventos, se informar. Se for de serviço público, pode buscar grupos de discussão similares ao NAP. Acho muito importante que se crie e fortaleça as redes de apoio – creches, sistema de saúde com qualidade, ações realizadas por instituições diversas. O que temos são ainda “retalhos” – frisa.
História – Referência de mobilização, o 18 de maio foi escolhido para lembrar a menina Araceli Cabrera Sanches, sequestrada nesta data, em 1973, aos oito anos. Drogada, espancada, estuprada e assassinada – crime ainda impune – sua morte ainda causa indignação e revolta. “A sociedade precisa garantir os direitos de todas as suas Aracelis”, reforça a dra. Rachel.
Saiba mais:
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Por Mariana Haubert – 15/05/2014
O plenário da Câmara aprovou o projeto de lei que torna crime hediondo explorar sexualmente crianças e adolescentes. O texto agora segue para sanção da presidente Dilma Rousseff (PT).
O projeto acrescenta na lista de crimes hediondos o favorecimento da prostituição ou de outra forma de exploração sexual de crianças, de adolescentes ou de vulneráveis (como são consideradas as pessoas com deficiência ou enfermidade).
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